Há oito dias que a população do Líbano está nas ruas em manifestações a pedir a queda do Governo e a gritar revolução. Para além da capital, Beirute, também a segunda maior cidade do país, Tripoli, tem visto sair à rua milhares de pessoas, tal como tem acontecido um pouco por todo o sul do país: esse tem sido o maios espanto sobretudo para quem está no poder, uma vez que a região tem sido sempre um reduto do mais poderoso grupo político do país, o Hezbollah.
Na segunda-feira, 21 de outubro, Saad Al-Hariri agradeceu a toda a população ter saído à rua para lutar pelos seus interesses, garantindo que o governo tinha ouvido a voz do povo e que nesse sentido, tinha decidido cortar em metade os vencimentos dos políticos. Na mesma ocaisão, o primeiro-ministro garantiu que não haverá novos impostos no Orçamento do Estado para 2020 e que vai pedir um reforço da atuação das empresas privadas no combate ao défice elevado do país.
Afirmou ainda que, desde que os protestos se mantenham pacíficos, não iria fazer nada para os travar. A verdade é que logo na terça-feira seguinte uma diretiva do Executivo dava ordem para que todos os estudantes regressassem às aulas. Em protesto, as universidades do país fecharam as portas e as pessoas continuaram nas ruas a pedir que sejam resolvidas coisas tão básicas como o acesso a eletricidade 24 horas por dia (atualmente todas as casas precisam de um gerador) e água canalizada potável.
Também os vários líderes religiosos já se fizeram ouvir, afirmando apenas que estão com o povo nas suas reivindicações, e pedindo que tudo se mantenha tranquilo e sem violência.
O cientistas político Michel Douaihy realçava à Al Jazeera que tem sido, precisamente, a descentralização dos protestos que tem ‘acelerado a preocupação’ do governo. “Pela primeira vez temos protestos no sul do Líbano, uma área muito controlada politicamente, protestos em Bekaa, nas montanhas em Tripoli”, referia o especialista.
Escalada de violência no horizonte
A maior fonte de preocupação, atualmente, é o facto de os protestos já durarem há demasiados dias sem que haja qualquer tomada de posição efetiva por parte dos governantes – a probabilidade de a violência começar a aumentar, nestas situações, é geralmente mais elevada.
“A força das manifestações no Líbano,que mobilizam a comunidade política para lá das velhas divisões sectárias e religiosas que dominam a política libanesa, é impressionante e revela uma crise de regime”, salienta à VISÃO Carlos Gaspar, professor do Instituto Português de Relações Internacionais. “O risco principal, neste momento, é uma derrapagem violenta que abra caminho à repressão governamental e ao reforço dos partidos xiitas armados, nomeadamente o Hezbollah, que continua a apoiar o presidente libanês e que é um instrumento da estratégia regional dos Guardas Revolucionários iranianos”, esclarece o especialista.
“Mas, se for possível garantir uma transição constitucional e a formação de um governo alternativo com capacidade para restaurar a independência nacional do Líbano, é fundamental assegurar as suas condições de sucesso, que dependem largamente dos países europeus e dos expatriados libaneses”.
Muchel Aoun, o presidente do país, decidiu falar ao povo esta quinta-feira, 24 de outubro, através de uma mensagem televisiva, afirmando que Al-Hariri deu o primeiro passo ao anunciar um pacote de reformas, e lembrando que não basta fazer cair o governo para resolver problemas. Aliás, afirmou, o responsável, fazê-lo poderia criar “um vácuo” com consequências inesperadas.
“Estou pronto para me encontrar com os vossos representantes e ouvir as vossas exigências específicas. Vão ouvir também os nossos receios em torno do colapso financeiro do país”, afirmou Aoun citado pela Al Jazeera. O diálogo é sempre a melhor forma de salvação. Espero por vós!”.
Logo após a transmissão desta mensagem foram ouvidas vaias pelas ruas de Beirute e alguns dos protestantes, citados pela imprensa internacional, mostraram-se desiludidos com o facto de o presidente do país ter sido tão vago quanto o primeiro-ministro na sua declaração no início da semana.