Bastou que a filha preferida de Donald Trump tivesse comprado uma mansão por cinco milhões de dólares, em Kalorama, um dos bairros mais chiques de Washington D.C., a capital dos EUA. E claro que os meios de comunicação social chegaram logo à conclusão que Ivanka e o seu marido, Jared Kushner, iam assumir um papel importante na Casa Branca. No passado dia 9, a confirmação oficial chegava: o homem que esta sexta-feira, 20 de janeiro, sucedeu a Barack Obama escolheu o seu próprio genro como Conselheiro Sénior, uma nomeação em jeito de prenda por ter sido feita na véspera do 36º aniversário de Jared. E que promete dar muita polémica devido a possíveis conflitos de interesses e à total inexperiência política do jovem já conhecido por “pequeno Donald”.
1 – O cábula do 4X4
Neto de sobreviventes do Holocausto e filho de Charles Kushner, empresário que fez fortuna a construir e a vender imóveis em Nova Jérsia, Jared cresceu numa cidade desse estado, Livingstone. Aluno mediano, tinha por objetivo e imposição familiar formar-se em direito e ser juiz. Apesar das más notas, conseguiu entrar em Harvard, onde se movia num luxuoso todo-o-terreno. Uma investigação do jornalista Daniel Golden alega que isso se deve ao facto do seu pai ter doado 2,5 milhões dólares à Universidade, em 1998.
2 – Pai preso, patrão precoce
Em 2004, após ter concluído um MBA na Universidade de Nova Iorque – que receberia também uma doação de três milhões dos Kuchner – Jared assume a liderança dos negócios da família. Motivo: o pai é condenado a uma pena de prisão de 18 meses por fraude fiscal e suborno, num processo em que as acusações são da responsabilidade de Chris Christie, então procurador de Nova Jérsia, futuro governador estadual e apoiante de Trump à presidência.
3 – O Conde de Monte Cristo
Jared terá jurado vingança pelo que sucedeu ao seu progenitor e, segundo o New York Times, inspirou-se na personagem do famoso livro de Alexandre Dumas para fazer justiça. O tempo viria a ajudá-lo, enquanto os seus interesses se viram para Manhattan.
4 – Magnata de imprensa
Aos 25 anos e gestor de uma fortuna avaliada em 500 milhões de dólares, Jared decide por capricho adquirir um tabloide nova-iorquino, o New York Observer. Desde então, despediu sete diretores e um dia depois de Donald Trump ganhar a presidência, a 9 de novembro, a publicação (uma das poucas que apelou ao voto no candidato republicano) deixou de ter edição em papel.
5 – Murdoch, Wendi e Ivanka
O mundo dos media leva-o a privar com Rupert Murdoch e, graças à antiga mulher do empresário australiano, Wendi Deng, conhece Ivanka Trump. Nesse mesmo ano, em 2007, compra uma torre de escritórios no número 666 da Quinta Avenida por 1800 milhões de dólares – um valor record na cidade.
6 – O virtuoso pai de família
Em 2009, casa com a filha preferida de Donald Trump, após ultrapassar as reservas da família Kushner e Ivanka se converter ao judaísmo. O casal tem agora três crianças: Arabella, de cinco anos, Joseph, de 3, e Theodore, de 10 meses. Amante da privacidade, gosta porém de frequentar os circuitos sociais da Big Apple com a mulher.
7 – Inesperado trunfo de campanha
Após Trump entrar na corrida à Casa Branca e tecer comentários xenófobos, Jared fez questão de envolver-se na campanha para dizer que o seu sogro não era “racista nem antissemita”. Em março, escreve o discurso que Trump leu para uma plateia judaica e convence o candidato. Pouco depois, consegue mobilizar alguns seus conhecidos de Silicon Valley, em particular Peter Thiel, o milionário cofundador da PayPal. Em novembro, Eric Schmidt, ex-administrador da Google e um dos homens mais ricos do mundo, disse à Forbes que Jared Kushner “é a maior surpresa das eleições de 2016”.
8 – As purgas do grande vingador
Responsável pela comunicação digital e mostrando uma enorme eficácia na gestão dos (parcos) fundos ao seu dispor, faz com que Donald Trump despeça dois gurus e gestores da campanha: Paul Manafort e Corey Lewandowski. Por outro lado, convence-o a convidar Mike Pence para vice-presidente, em vez de Chris Christie – o homem que pôs o seu pai na cadeia. Como se não bastasse, consegue ainda que este último e Mike Rogers sejam definitivamente afastados da equipa de colaboradores do novo chefe de Estado.
9 – Amigo dos negócios da China
Após a vitória de Donald Trump participa nas reuniões decisivas para a escolha da nova Administração e é ele que aparece sempre na fotografia quando o sogro recebe o primeiro-ministro japonês e outras personalidades na Trump Tower. Pelo meio, como revelou o New York Times, acautelou os seus negócios particulares: a 16 de novembro jantou com o patrão do conglomerado chinês Anbang, interessado em alargar os seus investimentos nos EUA e potencial comprador da principal joia imobiliária dos Kushner, a torre 666 da Quinta Avenida. Nesta data, Jared tinha já contratado uma prestigiada sociedade de advogados, a WilmerHale, para o aconselhar sobre eventuais conflitos de interesses.
10 – O altruísta do Médio Oriente
Para contornar as leis federais antinepotismo, já abdicou de todos os cargos que tinha nas suas empresas e fez saber que não iria receber um cêntimo como conselheiro da Casa Branca. Assim não precisa de prestar contas sobre os seus rendimentos e interesses financeiros, nem sobre os empréstimos que recebeu do banco Hapoalim, o maior de Israel. Só falta que o sogro repita uma vez mais que Jared “pode ser uma magnífica ajuda para que se alcance a paz” no Médio Oriente.
(Artigo publicado na VISÃO 1245, de 12 de janeiro)