Há quase 1 ano que os alicerces do acordo de Schengen são abalados por uma vaga migratória de proporções trágicas. Ao longo desse tempo tem-se questionado o sentido de solidariedade internacional, em particular o europeu, a capacidade de apreender e solucionar um drama transversal e a validade de um projecto cujas sucessivas fracturas têm sido expostas a nu, apesar do discurso mediático em torno da ideia de parceria e união.
Numa altura em que chefes de estado e de governo da UE se reúnem em Bruxelas para avaliar a eficácia das directrizes estabelecidas no final de 2015 e reequacionar o sistema de asilo europeu na tentativa de prevenir o seu colapso, António Guterres ex Alto Comissário do ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados) é ouvido na comissão parlamentar dos negócios estrangeiros afirmando ver com preocupação a adopção de medidas restritivas que se limitam a “sacudir” para o país vizinho os civis que atingem as fronteiras europeias em condições de total subversão dos direitos humanos. A ausência de uma atitude concertada a montante, com os membros a não afinarem pelo mesmo diapasão, faz com que a europa assista – sem no entanto criar um plano de combate – ao florescimento de complexas redes de crime organizado que manobram um indestrinçável sistema de tráfico.
E se a noção de acolhimento tem sido posta em causa, verificando-se a multiplicação diária do número de órfãos, desalojados, náufragos e feridos, outros movimentos surgem como a conferência humanitária de Londres, de 4 de fevereiro, para angariação de fundos de emergência, visando amenizar a extrema vulnerabilidade de 13,5 milhões de sírios, bem como sensibilizar a comunidade internacional para um apoio a longo prazo que contribua, efectivamente, para a reconstrução e desenvolvimento de um país devastado por um conflito armado de 5 anos.
Guterres esclarece ainda que é preciso situar os números numa escala realista: cada milhão de migrantes que aspira chegar ao continente equivale a “pouco menos de dois refugiados por cada mil cidadãos a viver na Europa” e que “as migrações são uma constante na história e devem ser vistas como uma parte da solução do problema da humanidade e não como uma parte do problema”. Pedro Calado, Alto Comissário para as Migrações, desvenda, por outro lado, uma dimensão impossível de ignorar: os imigrantes são, hoje, mais de 232 milhões de indivíduos. E se constituíssem uma nação, seriam o 5º país mais populoso do mundo.
Recorremos à GlobalStat para uma observação dinâmica do assunto que domina a agenda internacional:
1) Embora o Afeganistão lidere o ranking do número de refugiados por país de origem, o valor decaiu perto de 40% em 12 anos. Em contrapartida, no mesmo período, a Síria viu o número de refugiados aumentar em mais de 99%. Segundo dados de Junho de 2015 do ACNUR, podemos considerar que perto de 12 milhões de pessoas oriundas da Síria vivem, hoje, sob risco. O aumento exponencial que se observa na Colômbia é sequela das deslocações internas em massa na tentativa de encontrar uma alternativa segura à violência perpetrada pelas forças do governo, guerrilheiros e paramilitares.
2. Sobre a percentagem de refugiados na bolsa de migrantes internacionais, a Síria está no topo da tabela e a Jordânia em segundo lugar (dados de 2013). O ACNUR revela que mais de meio milhão de refugiados vive em áreas urbanas da Jordânia (dados de 2015), em particular no campo de Zaatari, o maior do Oriente Médio, e que abrigava no ano passado, três anos depois de ter sido criado, mais de 80 mil refugiados sírios.
3. Relativamente ao número de refugiados por país de asilo, considerando refugiados, requerentes de asilo, pessoas deslocadas internamente, apátridas e indivíduos protegidos ou assistidos pelo ACNUR, verifica-se que os países emissores são, simultaneamente, receptores de população migrante em risco. Tal justifica-se por motivos relacionados com a vizinhança geográfica das áreas de conflito e pelas barreiras à saída, sejam de ordem física, económica ou burocrática.
3. Número de indivíduos que regressa ao país de origem depois de uma deslocação forçada devido a situações de conflito armado, violência, catástrofes naturais ou provocadas ou violação dos direitos humanos sem, no entanto, terem atravessado uma fronteira estatal internacionalmente reconhecida. Duas razões evocadas para explicar o retorno são, por um lado, o aparente (ou temporário) atenuar dos conflitos nas zonas mais afectadas e, por outro, a criação de medidas restritivas de acolhimento aos refugiados
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