O BEE (Bloco Empecilho de Esquerda)
O dia fica marcado pelas sequelas do debate de ontem. As comadres zangaram-se, no debate a seis, na RTP: Catarina Martins deu uma “chazada” a António Costa, dizendo o que lhe vai na alma, a propósito dos constantes ataques do PS ao BEE (Bloco Empecilho de Esquerda). Revelou uma reunião “secreta” entre PS e BE na manhã das anteriores eleições, a 4 de outubro de 2015, mas isso ainda foi o menos: o que fica a pairar é a certeza de que uma Geringonça.2 não são favas contadas: por um lado, a suposta deslealdade de Catarina Martins, ao ter revelado a tal “reunião privada”, enfureceu António Costa, pondo-o de pé atrás sobre a fiabilidade e a maturidade política da até agora parceira de “posições conjuntas”. Por outro, antevê-se que o caderno de encargos do Bloco será fortalecido. De uma certa forma, isto favorece Costa, no seu argumento de comparação entre o que se passa em Espanha, com o PSOE e o Podemos, e o que poderá vir a passar-se em Portugal. Por outro, a “peixeirada” favorece mais a CDU, que fica fora deste filme, e o PSD: Rui Rio diz que teve direito a espetáculo “sem pagar bilhete”. Esta terça-feria, Catarina Martins continuou a carregar na ferida. Mas Costa, confrontado pelos jornalistas, chutou para canto: “O tempo dos debates já acabou”. Perante a insistência, em plena viagem de comboio em direção à margem sul – o PS dedicou o dia aos transportes – Costa limitou-se a dizer: “Olha! Chegámos ao Fogueteiro!”
Centenos há muitos, ó palerma!
Um dos romances mais surpreendentes de José Saramago, uma espécie de thriller policial, tem por título “O Homem Duplicado”. Nele, o protagonista descobre que existe um sósia que atua como um duplo, na sua vida, com a mesma identidade, os mesmos hábitos, o mesmo rosto. E passa pelo enredo do romance obcecado em encontrá-lo. Recriando uma história que desconhecemos se terá lido, e depois de, ontem, ter dito que também dispõe de “um Mário Centeno” (o porta-voz para a área das Finanças, Joaquim Sarmento, professor auxiliar do ISEG), o líder do PSD veio hoje desafiar o “Joaquim Sarmento de António Costa” [Mário Centeno] para um debate com o Joaquim Sarmento verdadeiro – o seu. O tempo dos debates pode ter acabado, mas o certo é que Rui Rio pediu um debate extra. E acaba por sacar da cartola uma inteligente ideia, suscetível de enervar o PS: “Se o dr. António Costa”, justificou Rio, “tem tanta certeza sobre os números que atirou para cima da mesa, nos debates, que deixe o Joaquim Sarmento dele debater com o meu esses assuntos”. Com este desafio, de resultados práticos duvidosos – é muito pouco provável que o repto seja aceite, ou, então, o PS cederia a gestão da agenda política ao PSD… – Rui Rio pretende atacar o flanco onde o governo tem mais credibilidade, o do controlo das contas públicas, confrontando diretamente, e chamando a terreiro, o “intocável” ministro das Finanças, principal trunfo eleitoral dos socialistas. Nunca ninguém o tinha feito. Recusando o PS o desafio, é legítimo que se possa instalar, no espírito do eleitor, uma dúvida sobre a efetiva “excelência” e competência de um ministro que se recusa a debater as suas políticas. Ou, pelo menos, Rui Rio espera que essa dúvida se instale. É bem pensado.
A bola queima
Se António Costa andou de comboio, Assunção Cristas andou de barco, a caminho do Barreiro, no intuito de mostrar as suas propostas para a travessia do Tejo. Se tudo se joga em Lisboa – onde a líder centrista conseguiu um espetacular resultado nas autárquicas de 2017 – a bola queima na Margem Sul: Nuno Magalhães, líder parlamentar cessante, recandidata-se por Setúbal e, segundo as últimas sondagens, arrisca-se a não ser eleito. Uma nota: não sabemos se Costa ou Cristas tiraram o passe único, este mês. Mas era uma boa pergunta.
Outro nome sonante com dificuldades de reeleição é o das deputada dos Verdes, Heloísa Apolónia. Relegada, nas listas da CDU, para o difícil e conservador círculo de Leiria, uma espécie de cavaquistão, onde nem o PS conseguiu, jamais, um primeiro lugar em legislativas, a combativa cabeça de lista da CDU está a dar tudo por tudo. E Jerónimo de Sousa, que hoje a visitou, teve de garantir, quase sob palavra de honra, que a transferência de Heloísa para Leiria “não foi uma despromoção”. No partido das paredes de vidro, as comadres nunca se zangam.