Perplexa com as conclusões e os factos que lhe são imputados e discriminada pela forma como foi ouvida. É desta forma que Christine Ourmières-Widener reagiu perante a Inspeção Geral das Finanças, depois de conhecer a versão preliminar do relatório sobre a saída de Alexandra Reis da TAP.
Para além da versão final do relatório, nesta segunda-feira foram divulgados também mais de 20 anexos, alguns dos quais com o contraditório de alguns responsáveis da TAP e do Governo face ao que a IGF tinha apurado preliminarmente. Para além da versão de Alexandra Reis, Pedro Nuno Santos e Manuel Beja, também a até aqui CEO da TAP se pronunciou, num documento de seis páginas.
Na resposta, Ourmières-Widener rejeita todas as responsabilidades que lhe são imputadas pela IGF, suportando-se sobretudo em três argumentos: a confiança de que os responsáveis do Governo e os especialistas jurídicos teriam da lei aplicável; a sua função sobretudo de gestão operacional e não de relação institucional com o acionista Estado; e o facto de não ser jurista nem falar bem a língua portuguesa.
“Em momento algum deste processo negocial foi equacionado, por nenhum dos intervenientes, em particular por nenhum dos assessores jurídicos envolvidos, mas também pelos governantes e pelos membros dos seus gabinetes, o enquadramento legal da situação em presença à luz do EGP”, afirma a sua resposta. O facto de o contrato de Alexandra Reis se encontrar ao abrigo do Estatuto do Gestor Público (EGP), de acordo com a IGF, torna nulos os termos do acordo de saída no que toca à sua compensação financeira. No entanto, ninguém o invocou, o que levou a que as negociações e os termos acordados não o fossem ao abrigo destas regras, mais restritivas.
Em momento algum deste processo negocial foi equacionado, por nenhum dos intervenientes, em particular por nenhum dos assessores jurídicos envolvidos, mas também pelos governantes e pelos membros dos seus gabinetes, o enquadramento legal da situação em presença à luz do EGP
“Tendo este detalhe escapado a pessoas com conhecimentos jurídicos qualificados , e com especiais deveres de zelo e diligência quanto ao estudo de todos os cenários legais aplicáveis ao caso que lhes foi confiado, como poderia a aqui Respondente antever outra hipótese de enquadramento jurídico da situação que não o que lhe foi apresentado?”, prossegue.
Em segundo lugar, Christine Ourmières-Widener afasta também a responsabilidade sobre a não informação do Ministério das Finanças sobre o processo, com dois argumentos.
O primeiro é que, tendo informado e obtido luz verde do Ministério das Infraestruturas e Habitação, “estava convencida de não seria necessária à conclusão do acordo com a Engª Alexandra Reis qualquer autorização adicional por parte do Ministério das Finanças”.
O segundo é que, a haver comunicação da TAP, tal responsabilidade seria do chairman, Manuel Beja, e não sua. “Não lhe caberia a si, pessoalmente, o dever de comunicar ao representante do acionista o acordo alcançado, confiando que tal teria sido feito ao nível do Governo, pelos membros responsáveis pela tutela setorial ou, no plano institucional da TAP, pelo presidente do seu Conselho de Administração. Na verdade, as relações com o acionista constituem matéria que, em primeira linha, respeita ao núcleo das funções do presidente do Conselho de Administração”, continua.
Acrescentando que “não cabe à Respondente, consequentemente, qualquer responsabilidade a respeito de uma eventual omissão de comunicação junto do Ministério das Finanças, porquanto tal dever não recaía pessoalmente sobre si e, ademais, tinha fundadas razões para supor que tal comunicação teria sido efetuada pelas vias institucionais apropriadas”.
Não lhe caberia a si, pessoalmente, o dever de comunicar ao representante do acionista o acordo alcançado, confiando que tal teria sido feito ao nível do Governo, pelos membros responsáveis pela tutela setorial ou, no plano institucional da TAP, pelo presidente do seu Conselho de Administração
Por último, a CEO da TAP refere por mais que uma vez que não é jurista de formação nem muito menos tem conhecimento aprofundado da lei portuguesa. Logo na primeira parte da resposta, a gestora afirma que “sublinhe-se, desde já, que a Respondente não é portuguesa e não domina a língua portuguesa. Não é jurista de formação nem tem quaisquer conhecimentos jurídicos ou experiência de gestão de empresas do sector público em Portugal”.
Por tudo isto, Ourmières-Widener afirma várias vezes a sua “perplexidade” pela responsabilidade que o relatório da IGF lhe atribui neste processo, nomeadamente nas suas falhas legais.
“Discriminação” terá resposta legal
A gestora queixa-se ainda de ter sido discriminada pela IGF, pela forma como alegadamente foi ouvida nesta inspeção. “Vem a Respondente manifestar a sua perplexidade ao constatar que, lamentavelmente, foi a única pessoa diretamente envolvida na auditoria que não foi ouvida pessoalmente perante a Inspeção Geral das Finanças”, pode ler-se. “Fica devidamente registado este comportamento discriminatório por parte da IGF, relativamente ao qual não deixará de se tirar, em devido tempo, todas as consequências legais”, acrescenta.
Fica devidamente registado este comportamento discriminatório por parte da IGF, relativamente ao qual não deixará de se tirar, em devido tempo, todas as consequências legais
No entanto, na resposta da IGF, esta desmente esta versão. “Sublinhamos que esta Autoridade de Auditoria cumpriu as normas que regem a sua atuação, em especial e no que releva para o caso em apreço, ouvindo a Eng.ª CW em contraditório formal pessoal”, pode ler-se num dos anexos. Este revela ainda que “para além da audição em sede de contraditório, também na fase de execução da ação foi a Eng.ª CW convidada a responder por escrito a um conjunto de questões formuladas pela IGF que não se encontravam suficientemente esclarecidas, diligência esta que substituiu a audição pessoal”.
A IGF termina esta parte da resposta aos comentários da ex-CEO da TAP dizendo que “é à IGF que compete estabelecer a metodologia que entende adequada às ações que desenvolve, o que não impediria que a Eng.ª CW tivesse prestado à IGF, por sua iniciativa, esclarecimentos adicionais, por qualquer forma escrita ou verbal, ou suscitado as questões que entendesse pertinentes para a ação em curso”.