Nos Jogos Olímpicos do México 1968, Dick Fosbury, com apenas 21 anos, era um quase desconhecido quando se apresentou para a final da competição de salto em altura. Mas depressa deu nas vistas e obrigou todos os jornalistas e comentadores a fixarem o seu nome. Tudo por causa da forma, nunca vista em anteriores competições, como saltava sobre a fasquia: de costas, após uma corrida em curva em direção à chamada (quando todos os outros concorrentes usavam a técnica habitual do rolamento ventral). Fosbury ganhou a medalha de ouro, estabeleceu um novo recorde olímpico e, mais importante ainda, perpetuou o seu nome para sempre no atletismo, com essa técnica que agora é usada por todos os saltadores. O inventor do “Fosbury Flop” morreu hoje, 13 de março, aos 76 anos. Oportunidade para recordar uma entrevista que deu à VISÃO, em 2012, durante os Jogos Olímpicos de Londres.
Como é que se lembrou de começar a saltar de costas, quando todos o faziam com o chamado rolamento ventral?
Foi um acidente. Teve tudo a ver com a forma como, nos treinos, nós fazíamos umas corridas de aproximação à fasquia. Aos poucos comecei a alargar a curva, cada vez mais e mais. E comecei a saltar de costas, porque era o movimento mais natural provocado por essa corrida. Qualquer um podia ter inventado essa técnica. Qualquer um… Este é um movimento natural. Mas, obviamente, estou muito orgulhoso por ter sido o primeiro.
De tal modo que a técnica ficou com o seu nome…
Sim, mas só tem o meu nome porque obtive resultados. Podia ter inventado todas as técnicas de salto em altura, mas se não tivesse sido campeão olímpico ninguém teria fixado o meu nome. Essa é que é a verdade. Os Jogos Olímpicos é que mudaram a minha vida.

No início foi difícil convencer os seus treinadores?
Sim, claro. Mas como eu ia melhorando os meus resultados, eles próprios começaram também a tentar perceber o que estava ali a funcionar melhor. E, como sou muito competitivo, fui fazendo evoluir a técnica, saltando sempre mais e mais.
Alguma vez esperou que a técnica se tornasse depois usada por todos os atletas, como hoje sucede?
Não. Nessa altura não pensava nisso. Fiz aquilo porque queria melhorar.
É essa vontade de melhorar sempre que define um campeão?
É essa vontade, claro. E a sua capacidade para se adaptar às circunstâncias e aos adversários. Quando chegamos aos Jogos Olímpicos, todos achamos que somos os melhores, mas a verdade é que temos sempre que olhar para os que vêm atrás. É essa a beleza do desporto: não há vitórias garantidas nem antecipadas. Nuns Jogos Olímpicos, as medalhas ganham-se com 10% de físico e 90% de parte mental. Não tenho dúvidas sobre isso. Todos os que cá chegam vêm numa forma física extraordinária. O que os distingue, no fim, é a sua capacidade mental para se excederem no momento certo. Lembro-me do meu colega Al Oerter. Em quatro Jogos Olímpicos ganhou quatro medalhas de ouro no lançamento do disco e bateu quatro recordes mundiais. E, nas quatro vezes, nunca partiu como favorito. Só que provou sempre que era mentalmente mais forte do que todos os outros.
A pressão de um povo, dos adeptos, pode ser negativa para os atletas nuns Jogos Olímpicos? A pressão de hoje é muito superior à do meu tempo de atleta. Mas hoje também os desportistas têm muito mais apoio do que no meu tempo: equipas dedicadas à volta deles, com psicólogos, relações públicas e uma série de pessoas que os ajudam a lidar com essa pressão. Porque ela é, de facto, mais um dos desafios que um atleta tem que enfrentar nuns Jogos Olímpicos. Quando se chega a um nível destes, se entra na Aldeia Olímpica e se vê todos aqueles que admiramos à nossa volta… é normal uma pessoa ficar excitada e desconcentrada. É preciso ter alguém que o ajude a focar novamente na competição, naquilo que veio cá fazer.
Qual é a melhor recordação que guarda dos Jogos Olímpicos?
Foi um momento no México 1968 que nada teve a ver com a competição. Antes dos Jogos começarem, eu e um amigo soubemos que a chama olímpica ia ficar durante a noite nas pirâmides, nos arredores da Cidade do México. Fomos para lá e por lá ficamos, toda a noite, numa festa absolutamente inesquecível, em que percebemos a paixão e a alegria que o povo mexicano tinha pelos Olímpicos. Quando quisemos regressar, de manhã, apanhámos com um enorme engarrafamento de trânsito. Resultado: nenhum de nós pode participar na cerimónia de abertura. Ficámos a dormir.
Disse que os Jogos Olímpicos lhe mudaram a vida. De que maneira? Ficou rico?
Não, não fiquei rico. Mas deram-me a oportunidade de conhecer gente maravilhosa, e de poder ser convidado para andar por todo o mundo, em acontecimentos destes, a contar a minha experiência pessoal, a dizer às pessoas que, ás vezes, temos que mudar… se queremos ganhar.