Mia Couto estreou-se literariamente em Portugal em 1987 com a edição de Vozes Anoitecidas, uma coletânea de contos. E é a esse formato que regressa no novo livro, O Caçador de Elefantes Invisíveis. Na sessão de apresentação – na quinta-feira, 4, na Biblioteca Palácio Galveias, em Lisboa -, o seu editor de sempre em Portugal, Zeferino Coelho (Caminho/Leya) sublinhou que “Mia é um grande contista, havendo quem diga que é mesmo, sobretudo, ‘contista’, porque em muitos dos seus romances cada personagem podia desdobrar-se em contos autónomos.”
O lançamento foi organizado conjuntamente pela Biblioteca das Galveias, a Leya e a VISÃO, já que os contos deste novo livro partiram todos das crónicas que Mia Couto escreve mensalmente na VISÃO. O escritor ironizou, dizendo “preciso de um patrão”, sugerindo que nenhum destes textos existiria sem essa obrigação mensal… Recordou os seus longínquos anos como jornalista (de meados dos anos 70 até 1985) e a frustração que sentia ao tentar passar para textos jornalísticos as verdades complexas e profundas com que lidava nas suas deambulações moçambicanas: “Encontrava um Moçambique que fui aprendendo a conhecer.” A literatura estava sempre à espreita e, na Biblioteca das Galveias, Mia Couto admitiu: “Vindo da poesia, o conto é o género onde me reconheço mais.”
No caso dos textos que compõem O Caçador de Elefantes Invisíveis, há muitas vezes uma ligação direta a acontecimentos da atualidade, que são pretexto para o imaginário onírico, quase mágico, profundamente ligado às tradições africanas a que Mia habituou os seus leitores. A propósito desse jogo entre jornalismo/realidade e ficção, Zeferino Coelho fez questão de dizer: “Têm saído várias notícias relacionadas com o combate à Covid em África mas quem ler o conto Um Gentil Ladrão perceberá melhor, talvez, o que se passa nessa matéria…”. Mafalda Anjos, diretora da VISÃO, sublinhou o privilégio de publicar, em cinco ou seis mil caracteres que nos fazem “pensar, rir, chorar…”, textos de “um dos grandes mestres da arte do conto em língua portuguesa.”
Para a edição em livro, Mia fez pequenas alterações, reescritas, acrescentos ou cortes nas crónicas originais – falou a esse propósito da escrita como “coisa infinita” e da “permanente insatisfação”. “É um perfecionista?” disparou a diretora da VISÃO. Depois de um breve silêncio Mia Couto respondeu ao seu melhor estilo de inventor de palavras: “…acho que sou mais um imperfecionista”
No final, na plateia, o escritor angolano José Eduardo Agualusa (que também assina crónicas mensalmente na VISÃO, nas páginas do início da revista que partilham com Dulce Maria Cardoso) resumiu bem o que se celebrava naquela sala: “É o regresso de um grande contista, não só da língua portuguesa, de um grande contista do mundo!”.