Traçar o perfil dos leitores de Literatura Portuguesa na FIL de Guadalajara é encontrar uma qualquer ligação biográfica ao Brasil, em primeiro lugar, devido à proximidade com o México, e depois, em menor frequência, a Portugal. Teresa Martins Dias pertence ao segundo grupo. Em Guimarães viveu quatro anos que nunca mais esquecerá, também porque foi aí que nasceu a sua filha. Não podia, por isso, perder a edição deste ano da maior feira do livro da América Latina. Com a família, acompanha as actividades do Pavilhão de Portugal e demora-se na livraria, em busca de autores portugueses. Mas isso tem outro motivo.
Teresa Dias é, como diz entre sorrisos, professora de português nos tempos livres. Geógrafa de formação, fez mestrado em Ciências da Terra e prepara agora o seu doutoramento. Quando regressou de Portugal à Universidade de Colima, uma cidade a 250 quilómetros de Guadalajara, na costa do Pacífico, ofereceu os seus conhecimentos ao departamento de línguas. E a verdade é que havia interessados. Hoje conta com cinco gerações de estudantes formados, o que a obrigou a criar vários níveis de ensino, do Português I ao IV.
Se a Geografia é a sua profissão, o ensino do Português está-lhe no coração. Não é preciso alongar a conversa para o perceber. “Trouxe comigo uma alma minhota”, diz, com carinho e em sotaque nortenho. É esse amor a Portugal e à Língua Portuguesa que tenta passar aos seus alunos. Não tem falhado na missão. Quando souberam que ia à FIL, todos lhes pediram um livro em português, qualquer que fosse. Confiariam na sua escolha. “É uma grande responsabilidade”, desabafa. Daí que tenha planeado passar a estantes da livraria do Pavilhão de Portugal a pente fino.
“Encantadora”. Teresa Dias gosta sobretudo de poesia. Fernando Pessoa, como não podia deixar de ser (é o autor mais conhecido da Literatura Portuguesa), mas também Camões. “Os sonetos de amor e a grande epopeia dos portugueses”, especifica. “É um autor sem comparação”. Pela sua experiência, recorrer a poemas pode ser uma estratégia pedagógica muito eficaz. “A proximidade com a língua espanhola ajuda muito no início. Depois é descobrir a beleza das palavras”, defende a professora universitária. “O português é especial, tem uma grande musicalidade”.
Nos seus alunos também se depara com encontros inesperados com a Língua Portuguesa, acasos de vida como o seu. Na turma deste ano tem dois casos excepcionais. Um camponês que lhe disse que queria aprofundar os seus conhecimentos em português, pois andava a praticar o idioma há duas semanas. Com ceticismo, Teresa Dias iniciou uma conversa. “E não é que falava perfeitamente?”, revela. “É incrível, um prodígio. Já domina sete línguas, todas aprendidas de forma autodidata. Começa a trabalhar no campo às cinco da manhã, acaba às oito da noite. Antes de dormir, pega num livro e estuda.”
Outro aluno tem um negócio de tortilhas de milho em Tecomán, a uma hora de viagem por auto-estrada. “Às vezes chega atrasado, mas eu desculpo. Deita-se por norma às seis, sete da manhã. Passa mais tempo no carro do que nas minhas aulas”, partilha. São história de uma paixão pelo português fora de horas e da geografia habitual.