No ano em que Portugal foi campeão da Europa, vale a pena “escalpelizar” o onze do ano. Escalpelizar é uma ótima palavra para iniciar uma crónica escrita inteiramente em futebolês. No fundo, e depois das derrotas recentes de um período de tróika, há que levantar a cabeça e tentar escapar aos últimos lugares da tabela classificativa. É preciso definir um onze base para lançar em jogo, constituído por jogadores que predominaram no quadro dos seus campeonatos (política, artes, desporto). Não faltou quem se destacasse, nestas e noutras atividades, e este onze bem podia ser substituído por outro qualquer, ou vice versa. Afinal, não sabemos todos que a lógica do futebol é igual à lógica da batata?
Na baliza, António Costa. Defendeu quase todas as bolas, embora não tenha conseguido manter as suas redes invioláveis. Aquele frango da administração da Caixa Geral de Depósitos foi um dos seus erros mais clamorosos. O árbitro ainda lhe perdoou um penalti (mantendo em campo o secretário de Estado Rocha Andrade, depois da infração cometida pelas viagens da Galp), mas o certo é que revelou bom golpe de rins e mãos de ferro na maior parte dos lances, sobretudo nos jogos internacionais, sustendo sucessivas vagas de ataque da Comissão Europeia.
À defesa, tivémos a dupla de centrais constituída por Rui Vitória e Mário Centeno. O primeiro aguentou bem o assédio da concorrência, recuperou de uma clara desvantagem em campo, do ponto de vista posicional (posição na tabela…) e chegou ao fim como campeão. Na presente época mantém os bons índices de jogo, comandando a competição. O segundo especializou-se nos cortes para fora, desviando os remates da Comissão Europeia e colocando fora de jogo os avançados do Plano B. Quando foi necessário, produziu longos minutos de antijogo, promovendo as cativações que garantiram o cumprimento do défice. Não jogou bonito, mas foi eficaz. Não está isento de culpas no dossiê da administração da Caixa, onde foi reincidente em faltas para grande penalidade. Mas o árbitro da opinião pública parece ter feito vista grossa e evitou a expulsão.
A correr pela lateral esquerda, temos Arménio Carlos. O seu constante vaivém, entre o diálogo na concertação social e as reivindicações sindicais, permitiu manter alguma estabilidade no seu setor, evitando males maiores do ponto de vista da agitação social. Na asa direita assistimos a um verdadeiro concerto: muito bem, António Zambujo! Foi o ano de definitiva afirmação deste jogador, junto dos adeptos, com excelentes cruzamentos musicais com Miguel Araújo (com quem disputa a titularidade) que encantaram a plateia e encheram os estádios dos coliseus.
A capitanear o meio-campo esteve Fernando Santos. O selecionador nacional soube arrefecer o jogo no momento próprio, entrando no europeu com três empates, e lançando, depois, bolas em profundidade, que deram bons resultados nos jogos seguintes. Segurança é o que se espera deste trinco.
No miolo, sobre a esquerda, o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Pedro Nuno Santos, que envergou a camisola n,º 10. Anteriormente vocacionado para outras posições – antes de ir para o Governo era um extremo esquerdo muito fogoso… – especializou-se, agora a distribuir jogo, mantendo oleada, no Parlamento, a linha média da “geringonça”.
Sobre a direita, António Guterres. O novo secretário-geral da ONU não se dá bem em campos enlameados, como o pântano em que deixara, há uns anos, o País, mas, no terreno seco nos desertos dos campos de refugiados, tornou-se um exímio executante. Na corrida ao seu novo cargo, foi um médio de ataque com veia goleadora e ganhou por 15 a zero.
Na linha atacante, tivémos, à direita, Marcelo Rebelo de Sousa. O extremo direito do Onze de 2016, por vezes, agarra-se muito à bola e não a passa a ninguém. Mas a verdade é que essa fome de bola tornou-o omnipresente em campo, que encheu por completo. Já o viram a marcar, a auxiliar a defesa e até a substituir António Costa, salvando golos certos em cima da linha…
Sobre a esquerda, atuou Telma Monteiro. Na digressão ao Brasil foi a única que trabalhou para o bronze. Mas isso não a impediu de se destacar na equipa. A sua medalha, por ser a única, valeu ouro e colocou a equipa no pódio
A ponta de lança, alinhou o avançado de centro Éder, claro. Mas isso já vocês sabiam.