Portugal volta a apresentar saldos naturais negativos. Desde o início do século XX até 2010, o número de óbitos foi superior ao dos nascimentos em 1918 – ano em que a gripe pneumónica foi responsável pela morte de milhares de pessoas em poucos meses -, em 2007, em 2009 e, agora, em 2010.
A diminuição do número de nascimentos (no início dos anos 60 rondavam os 200 mil por ano, atualmente ficam-se pelos 100 mil) e a estabilização (fruto do envelhecimento da população) do número de óbitos ligeiramente acima dos 100 mil por ano, conforme os dados publicados na Pordata, explicam o sucedido.
Recentemente, as Nações Unidas deram a conhecer um cenário demográfico para Portugal, segundo o qual, até 2100, a população residente poderia perder cerca de 4 milhões de habitantes. Se assim fosse, Portugal, hoje com mais de 10,5 milhões de habitantes, poderia voltar a um volume populacional idêntico ao dos anos 1930, com menos de 7 milhões de residentes.
Houve quem tivesse ficado muito preocupado com o que estes números podem significar, responsabilizando-os, por exemplo, por eventuais perdas de competitividade. Mas, será mesmo assim? Será o número de pessoas indicador de desenvolvimento. Se o fosse, aonde situaríamos, por exemplo, a Dinamarca ou a Finlândia, com menos de 6 milhões de residentes? Ou a Islândia e a Eslovénia?
O cenário das Nações Unidas admite aumentos da esperança de vida à nascença – atingindo os 85,1 anos e os 90,4 anos, respetivamente para os homens e para as mulheres – e do nível de fecundidade, que passaria da atual média de 1,32 para 1,99 filhos por mulher. A confirmarem-se estas hipóteses, a população residente em Portugal atingiria ainda níveis de envelhecimento demográfico históricos, com a percentagem de idosos a passar dos atuais 18% para 31%, em 2100.
Com este cenário fica também desmistificada a ideia, igualmente muito difundida, de que com o aumento dos níveis de fecundidade se pode evitar o decréscimo da população e o envelhecimento demográfico – o que não é verdade. Só ilusoriamente o aumento da fecundidade pode ser, portanto, apresentado como solução para a diminuição da população e para o envelhecimento. Os números dão o mote e de outros países chegam também exemplos – em nenhum país da União Europeia, mesmo naqueles que apostaram de forma séria em políticas familiares, como a França ou a Suécia, está assegurada a substituição de gerações.
Embora os níveis de envelhecimento não se combatam (a população continuará a envelhecer no médio prazo), podem ser atenuados e o decréscimo populacional pode ser evitado. A via é só uma: com saldos migratórios significativamente positivos, componente que não foi considerada nos cálculos das Nações Unidas. Assim, a efectiva aposta na imigração e na fixação da população residente, seja ela de origem portuguesa ou estrangeira, é a resposta para quem está preocupado com o “declínio demográfico” e com o “envelhecimento” de Portugal. Essa resposta agrada a todos? Talvez não. Mas lembremo-nos das vantagens competitivas que os EUA, o Canadá, a Austrália têm retirado da imigração que a Europa não consegue – ou não quer – atrair.
A falácia que o declínio civilizacional e o envelhecimento demográfico se combatem pela natalidade não resiste, assim, aos mais elementares testes e aos mais simples argumentos. É tempo de concentrar a discussão e a reflexão informada sobre a sociedade presente e futura nas duas áreas demográficas que verdadeiramente importam: o envelhecimento e a imigração. A nossa capacidade de resistir às ameaças demográficas depende, acima de tudo, do modo como aprendermos a lidar com esses factos.
Para saber mais sobre estes e outros temas da sociedade portuguesa nos últimos 50 anos, consulte Portugal: os Números, o livro dos autores publicado na coleção de ensaios da Fundação Francisco Manuel dos Santos.