A troika aterrou em Portugal para fazer a 8.ª e 9.ª avaliações do cumprimento do Programa de Ajustamento Económico e Financeiro, em plena campanha autárquica e em vésperas de apresentação do Orçamento do Estado. Não é a melhor altura, mas Portugal não se pode queixar. Não é por culpa da Comissão Europeia, do Banco Central Europeu ou do Fundo Monetário Internacional que temos perdido tempo a brincar às crises governamentais ou às inconstitucionalidades, mostrando uma incompreensível incapacidade para desenhar soluções que possam responder, de forma categórica, aos problemas urgentes que o País tem por resolver.
Tudo parece ser velho e repetitivo, andando todos nós, até mesmo nos comentários, sempre à volta do mesmo. Mas a realidade é que, com mais ou menos voltas, e em alguns casos com voltas bem tortuosas, parece que não saímos da estaca zero: um Governo pouco coeso, com um programa pouco coerente do ponto de vista ideológico, e com resultados muito pouco consistentes. Uma oposição socialista que deu uma volta de 180 graus, passando de uma colaboração extrema para uma oposição igualmente extremada. E um Presidente com uma mensagem que não se percebe exatamente o que pretende transmitir.
Na praça pública, como se pode ler a partir da página ????, continuam a estar a redução das pensões do Estado, o aumento da idade de reforma, o corte de salários e de custos salariais da Função Pública e a possível manutenção da Contribuição Extraordinária de Solidariedade. Além de uma série de outras medidas que, na ausência de uma Reforma do Estado que tarda em dar sinal de si, vão aparecendo, aqui e ali, de forma aparentemente desarticulada, mostrando que alguns ministérios estão a trabalhar com o objetivo de reduzir custos de funcionamento, como aconteceu, no fim de semana passado, com a Justiça e as Finanças.
De sinal contrário, a redução do IRC e do IVA da restauração andam também nas bocas do mundo. Mas se a baixa gradual dos impostos sobre lucros das empresas começa, finalmente, a gerar algum consenso, o mesmo não se passa com o IVA, começando as divisões logo no seio do Governo. Coisa que também não é de estranhar, pelo menos enquanto não existir um caminho claro de sustentabilidade das contas públicas que permita aliviar, com segurança e sem risco de colapso orçamental, a pressão sobre as receitas fiscais.
Não é, mais uma vez, o melhor dos quadros para se mostrar num “exame” internacional. Sobretudo quando a única coisa em relação à qual parece existir consenso é a necessidade de alterar o que está contratualizado sobre as metas para o défice. Nesta matéria, a fasquia mínima para um ajustamento que toda a gente considera fundamental – do Governo à oposição, do patronato aos sindicatos, da generalidade dos economistas ao Presidente da República – é a passagem da meta de 4% de défice, em 2014, para 4,5%, a subida defendida pela dupla Portas-Albuquerque, no seu recente périplo internacional.
É um objetivo legítimo e racional, que nos garante uma redução do esforço de corte de despesa superior a 800 milhões de euros. É, além do mais, um objetivo prudente, porque alivia a pressão sobre os ténues sinais de crescimento que se começam a verificar. Mas não deixa de ser uma meta intermédia, de meio de caminho, e que, no caso, coloca ainda mais longe a meta final. Ou talvez não…
Mas o que falta é o que nos faz falta. E é o que toda a gente quer saber: com ou sem suavização do défice contratualizado para 2014, o que vamos fazer para cumprir o resto do programa e conseguir o equilíbrio orçamental? Como vamos atingir esse objetivo de 4,5%, em 2014? Com que políticas? Com que aumento de receitas ou com que diminuição de despesas? E depois disso, que compromissos assumimos para os anos seguintes? Estas são as questões que a troika quer ver respondidas de forma clara e taxativa.
Mas são questões que todos nós devíamos também, mais que ninguém, exigir ver esclarecidas. E não apenas pelo Governo, mas também pela oposição e pelo Presidente. E, à margem do exame da troika, dos outros credores atuais e futuros, das contas para o próximo orçamento e, sobretudo, das mensagens mais ou menos demagógicas próprias dos períodos eleitorais, devemos igualmente procurar resposta para outras duas questões essenciais: é ou não importante garantir o regresso à soberania financeira e à capacidade de desenhar políticas próprias e autónomas após 2014? Como vamos assegurar que não voltamos a cair numa situação de dependência externa e de impotência política como a que hoje vivemos? Que compromissos queremos assumir com nós próprios?
O pedido de resgate internacional foi anunciado por Sócrates em maio de 2011, há 28 longos meses. O regresso aos mercados, com ou sem programa cautelar, está previsto para julho de 2014, daqui a uns escassos dez meses. Estamos a fazer o quê e à espera de quê?