“O povo tem o direito de questionar e de querer garantir que os cargos de poder político não são usados para que alguns se sirvam a si e às suas famílias”, escreveu Pedro Nuno Santos, no primeiro comentário acerca da polémica sobre as nomeações de familiares para o Governo. O atual ministro das Infraestruturas e Habitação toca na essência da questão: é justo que se questione se há privilégios especiais, quando tantos casos são trazidos para a praça pública. Senão, vejamos:
A mulher de Pedro Nuno Santos, Ana Catarina Gamboa, foi nomeada chefe do gabinete do secretário de Estado-adjunto e dos Assuntos Parlamentares, José Duarte Cordeiro. Mariana Vieira da Silva, filha do ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, começou por ser secretária de Estado-adjunta de António Costa e assumiu em fevereiro a pasta de ministra da Presidência e da Modernização Administrativa. O ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, é casado com a ministra do Mar, Ana Paula Vitorino. Mafalda Serrasqueiro é casada com Pedro Delgado Alves, deputado e ex-líder da JS, e, conforme noticiou a VISÃO, foi nomeada chefe de gabinete do secretário de Estado-adjunto e da Modernização Administrativa. Francisca van Dunem, ministra da Justiça, é casada com Eduardo Paz Ferreira, escolhido por Ana Paula Vitorino para liderar a renegociação do terminal de Sines. O secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro, é casado com Susana Ramos, coordenadora da Unidade Nacional de Gestão do Mecanismo Financeiro do Espaço Económico Europeu. Os dois filhos de Diogo Lacerda Machado, um dos melhores amigos de António Costa, estão como técnicos em ministérios deste Governo. Podíamos continuar, mas talvez chegue para ilustrar.
Mas pior do que os factos, é a resposta leve de Carlos César, líder parlamentar socialista, que antes de justificar a competência dos nomeados com relações familiares dispara em direção a quem critica – BE e Marques Mendes. Não fica admirado que “em determinadas famílias, onde essa vocação [da política] e essa proximidade se multiplica, as pessoas tenham empenhamento cívico similar”, justifica. Bem pode dizer que a vocação política é, digamos, “contagiosa”, porque ele sabe bem do que fala – tem cinco familiares diretos em cargos públicos: a mulher, o filho, a nora, o irmão e a sobrinha.
Embora o PS pareça não perceber, há uma reflexão que tem de ser feita. Não duvido da competência dos nomeados, mas é lícito questionar se seriam as únicas boas soluções para estes cargos políticos. Um partido de círculo fechado, feito de maridos e mulheres, pais e filhos, primos, tios, sobrinhos, irmãos e amigos, é um partido que com certeza não incorpora o melhor que a sociedade tem para dar. É terreno fértil para os amiguismos, jeitinhos e favorecimentos. E se isto é mau sinal num partido, é péssimo num governo que se queira verdadeiramente comprometido com a meritocracia.