Os jornais têm dedicado bastante tempo ao “Liberdade”, o acampamento da juventude que milita ou consome o Bloco de Esquerda. Fazem bem, a coisa dá que pensar.
É tudo mais ou menos hilário, desde o “comboio das massagens”, à recusa das casas de banho binárias porque “a distinção homem/mulher é muito redutora”, dizem os organizadores. Enfim, asneira de miúdos e que cuspa para o ar quem os não tem. A coisa piora é quando tenta parecer séria…
O acampamento assume-se como “anticapitalista” e tem por objetivo “construir a liberdade que querem ver no mundo” e como seria esse mundo? “Seria construído e partilhado coletivamente”. Assim, só, sem mais.
Medo. Muito medo. O kholkoz da marijuana até parece giro no verão, mas depois já sabemos como é: os porcos tomam conta da quinta. Onde é que já ouvimos isto? Pois… Como é que isto acaba? Pois… Mas serão só os miúdos do Bloco os órfãos da crise, os únicos perdidos no mundo?
Não parece. Mesmo aqueles que acreditaram que havia vida para lá do muro e depois tiveram de ver o que era a vida atrás do muro, regressam hoje aos dogmas que testaram e viram falhar, numa espécie de amnésia folclórica, com brigada Victor Jara em fundo.
O problema da lenga lenga contra a austeridade, tanto de Tsipras como de Le Pen, é que replica, em circunstâncias mais aziagas, o mesmo tipo de credo – no nacionalismo e no protecionismo – que nos fez perder a liberdade no princípio do século.
No fim da Primeira Guerra Mundial a democracia varreu a Europa. Em duas décadas foi varrida da Europa. Tudo isto é, afinal, menos certo. A história está em movimento acelerado e é tempo de vigiar muito do que dávamos por adquirido.
O fascismo, o comunismo e a democracia liberal todos se apresentaram como o fim da história e mesmo que a última precise de muito aperfeiçoamento vai ser sempre preferível a qualquer deriva coletivista e autoritária.
É por isso que nos tempos mais difíceis, as pessoas precisam dos políticos como elite. Aqueles que resistem e procuram o bem. Como diz Raymond Aron, o problema da vida em comunidade não é científico. É humano. E as soluções são todas válidas, acrescento eu, desde que não façam o caminho que, já sabemos, primeiro nos leva à miséria e depois, também por isso, nos tira a liberdade.
A semana passada, os jovens republicanos de Harvard explicaram, de forma brilhante, porque não podem apoiar Trump. Na América, a crise também atingiu milhões de pessoas. Mas eles sabem e explicam que Trump não tem um plano para resolver isso. Tem um plano para explorar isso e tirar daí vantagem política.
A geringonça faz o mesmo. Explora a frustração de um povo exausto de sacrifícios. E pelos vistos resulta… A avaliar pela indigência dos comentários nas redes sociais há mesmo quem ache que aumentar o peso da exposição solar de 5 para 20% no IMI corresponde a um propósito de justiça social e não a um despudorado aumento de impostos para alimentar a mentira em que temos vivido este ano.
A única coisa que precisam é de nos rapar tudo o que puderem. Mas exploram, de forma vergonhosa e populista, uma luta de classes imaginária entre os “ricos” dos andares altos e os “pobres” dos andares baixos.
Pior, mais revelador, foi ainda o momento venezuelano em que as fontes do Governo tentaram atacar o poder judicial mentindo a propósito de juízes que tomam decisões que não querem respeitar. Quando se brinca com a separação de poderes o despudor já não pode ser ignorado.
O PS escolheu ser o gaiteiro do “Liberdade”, em vez do partido que enfrenta a crise económica, sem perder de vista o centro dos valores que erigiu no passado.
Não tem perdão e não resistirá quando houver oposição. Os organizadores do acampamento dizem que no regresso é um choque voltar à realidade. Percebe-se que vivam bem com um primeiro-ministro que, enquanto pode, faz exatamente o mesmo.
A diferença é que os miúdos do Bloco são inocentes e, por enquanto, inofensivos. O dr. Costa é o contrário. Saiu-nos um artista quando mais precisávamos de um Estadista.