O título é irónico, o filme é mais sobre a velhice do que sobre a juventude. Claro que as perspetivas facilmente se invertem: enquanto a juventude é uma permanente expectativa no futuro, a velhice é um sistemático recordar do passado. Numa das mais fortes parábolas do filme, a velhice é representada pelas imagens diminuídas e difusas que aparecem quando se espreita do lado errado dos binóculos. Enquanto a juventude, claro está, são os binóculos do lado certo, a ampliação daquilo que está distante, tão longe tão perto.
Juventude é o sexto filme do italiano Paolo Sorrentino a chegar a Cannes. Também é o sucessor do aclamado A Grande Beleza, e tal como Este é o Meu Lugar (em que Sean Penn faz de Robert Smith dos Cure) é totalmente falado em inglês. Há uma declarada tentativa de entrada no universo anglo-saxónico embora o filme não tenha propriamente os ingredientes hollywoodescos de quem possa irromper no mainstream. Contudo, tal como acontecia em A Grande Beleza, há no cinema de Paolo Sorrentino uma certa megalomania, que facilmente se pode confundir com petulância.
O filme tem o mérito de juntar dois ‘senadores’ do cinema mundial, numa idade já improvável. Temos lado a lado o britânico Michael Caine e o norte-americano Harvey Keitel. Um faz de compositor aposentado que recusa um convite da rainha de Inglaterra para dirigir um concerto pelo aniversário do príncipe Filipe. O outro de realizador decadente a preparar o seu filme testamentário.
A ação decorre numa estância luxuosa dos Alpes Suíços reservada a artistas e afins – a condição de artista é um dos temas prediletos de Sorrentino -, mas é mais do que isso. O realizador cria uma espécie de limbo idílico, num meio caminho entre o céu e aterra. Um espaço afastado da realidade do mundo, onde homens e mulheres de diversos talentos convivem e refletem sobre a vida e sobre si próprios antes de estarem prontos para seguir para o próximo estádio. Um retiro monástico de normas invertidas. Assim, ali tanto encontramos um realizador de cinema incompreendido, como a Miss Universo, ex-jogador de futebol que, apesar de nunca ser dito o seu nome, facilmente podemos identificá-lo como Diego Armando Maradona. Este Maradona, abafado e asmático, é mostrado num campo de ténis a pontapear sucessivamente a bola amarela em direção ao céu, como se quisesse lá chegar.
Faz parte do ambiente felliniano, em que a realidade é substituída por uma forte ideia de magia, de mundo dentro do mundo, sem que tal impeça que se reflita sobre as grandes questões da vida. Tal é ainda reforçado pela primazia do estilo, que em Sorrentino é quase tudo. A estética predomina. A maior preocupação de Sorrentino é, aparentemente, a criação de planos deslumbrantes, com um cuidado fotográfico extremo, mesmo que tal implique uma certa artificialidade. E, entretanto, fala da vida e da morte, da juventude e da velhice, questiona a arte e faz-nos conviver com os artistas. Sorrentino tem o mérito de apurar um estilo que se situa algures entre o deslumbramento e o pedantismo.