O presidente da delegação regional do Porto da Ordem dos Advogados garante que “há mais casos” como o de Neto de Moura nos tribunais portugueses. “Nos crimes de violência doméstica, nos crimes sexuais, que são os mais sensíveis, existem vários casos ao longo dos anos”, garante Paulo Pimenta. O líder regional da Ordem dos Advogados alerta para uma “falta de consciência” dos magistrados sobre as decisões que tomam.
Esta sexta-feira, o Conselho Regional do Porto da Ordem dos Advogados mostrou “preocupação” com a transferência de Neto de Moura – o juiz que tem estado sob atenção mediática pelas considerações que plasmou em vários acórdãos do Tribunal da Relação do Porto – para as varas cíveis. “A simples mudança para uma secção cível equivale a manter o problema de fundo”, bastando “pensar nos processos de divórcio e de regulação das responsabilidades parentais que o desembargador Neto de Moura terá para apreciar em recurso”, refere aquele órgão regional. A solução encontrada foi, sugere Paulo Pimenta à VISÃO, uma operação de cosmética.
“Se um juiz for mudado de uma secção para outra”, como a Relação do Porto decidiu fazer com Neto de Moura, “estas questões podem voltar a ser suscitadas”, uma vez que o juiz vai deparar-se com casos em que a sua “compreensão da vida e da realidade” entrará de novo em cena para as decisões que tenha de vir a tomar. A palavra tem de voltar ao Conselho Superior da Magistratura, defende o advogado. “Porque, se a cada caso sobre o qual se levantem reservas” – coma apresentação de pedidos de escusa – “o juiz for impedido de decidir, daqui a pouco, estarmos a falar de um juiz amputado”, diz Paulo Pimenta.
Em nome da “conveniência do serviço”, e porque era preciso “acalmar os ânimos” face à avalanche de críticas sobre os consideranços do juiz desembargador em casos de violência doméstica, o presidente da Relação de Lisboa decidiu esta semana afastar o juiz Neto de Moura daquele tribunal, transferindo-o para as varas cíveis. Questionado sobre se essa decisão poderá, precisamente, levar à apresentação reiterada de pedidos de afastamento de Neto de Moura, quando os arguidos se confrontem com o juiz nos casos em que estejam envolvidos, o líder regional da Ordem dos Advogados reconhece o “problema” que se criou: “No limite”, um magistrado colocado nesta situação “não pode ser juiz”.
Paulo Pimenta não tem “soluções ideais” para este caso. Defende apenas que mudar mentalidades vai implicar “muita formação”, até porque o advogado não está seguro de que se trate de uma questão geracional entre os magistrados. “O que me parece haver é uma grande falta de noção dos juízes relvativamente às consequências que as suas decisões têm”, diz.
O representante da Ordem admite que todo este debate “é muito mais sério do que possa parecer”, porque vai “ao centro do sistema” judicial: “Isto levanta a questão sobre se os juízes podem ou não ser sindicados, porque uma coisa é a sua independência e outra coisa é não poder discutir se há adequação das decisões” ao modelo atual de sociedade e, no limite, à própria Constituição.
O responsável da Ordem dos Advogados condena, no entanto, no “linchamento” que diz estar a ser feito a Neto de Moura. Esse caminho “é perigoso”, alerta.