Ao terceiro dia de luto nacional, a casa que foi também a de Mário Soares – a Assembleia da República – prestou-lhe homenagem. Perante o olhar dos filhos – Isabel nas galerias e João na bancada dos deputados – foram recordadas imagens do “grande português” que todos os partidos celebraram, num voto de pesar assumido por unanimidade e aplaudido de pé da esquerda à direita.
A homenagem devida a quem “tinha a intuição dos grandes políticos e a visão dos grandes estadistas”, como leu Ferro Rodrigues. A homenagem na casa que “era a cara dele”, como sublinhou Luís Montenegro e que, hoje, se uniu da esquerda à direita para em uníssono lhe cantar uma última vez o Hino Nacional, de pé e com Soares numa foto em frente à Assembleia da República nos ecrãs gigantes.
“No Portugal de Mário Soares há nobreza na política e há políticos de excelência em todos os quadrantes partidários. Política grande e políticos grandes é o que Soares merece”, vaticinou o líder parlamentar do PSD.
A Assembleia da República, pela voz do seu presidente Eduardo Ferro Rodrigues, lembrou a “marca demasiado grande” que Mário Soares deixa e lembrou-lhe o legado de “coragem política, de patriotismo democrático e de abertura ao mundo”.
Aquele que chegou a Santa Apolónia no “Comboio da Liberdade” permitiu ao País “apanhar” esse mesmo comboio. E a Assembleia recordou cada um dos seus passos na História, desde aquele hemiciclo que hoje lhe prestou homenagem até à Presidência da República ou ao PS. Porque o “seu exemplo de tolerância ajudou o país a unir-se e a reconciliar-se consigo mesmo, depois das tensões próprias de uma ditadura longa e do período revolucionário que se lhe seguiu”, o Parlamento assinalou hoje a “tristeza” pelo seu falecimento e transmitiu à família “o mais sentido pesar”.
O ministro dos Negócios Estrangeiros, que continuou hoje a representar o Governo em nome de António Costa, deixou um conjunto de ensinamentos. Ensinamentos e verdades que se colam na História de vida de Mário Soares. A ideia de que “a Europa é o presente e o destino de Portugal”, que a “democracia é um combate” e que ser patriótico é “decidir o destino em conformidade com a nossa Constituição e as nossas leis”.
André Silva, do PAN, lembrou “um inconformado, com grande sentido de missão pelo país e pela Europa” . E José Luís Ferreira, dos Verdes, falou do “Homem que marcou incontornavelmente a história do nosso País”.
Na mais curta declaração do dia, o PCP não deixou de prestar condolências à família e lamentar a morte de Mário Soares. Mas como disse João Oliveira lá de cima do hemiciclo, os comunistas não quiseram ser “hipócritas” e nem nesta hora aceitaram partilhar “elogios” à ação política de Soares que, para o PCP, se traduziu de forma negativa na vida dos portugueses , desde logo com a “adesão de Portugal à CEE”.
Também o CDS quis dizer o que pensava de Soares “com frontalidade”, sobretudo evocando “um processo de descolonização” que “foi apressado e trouxe sofrimento a milhares de portugueses”. E mesmo que Nuno Magalhães tenha lembrado o “militante e corajoso, combativo e persistente, convicto e conciliador quando necessário”, quis recordar neste dia o seu “papel decisivo” e “liderante” na manifestação da Fonte Luminosa e lembrou que “a ele se deve” o facto de Portugal não se ter então transformado numa ditadura.
“Devemos a Mário Soares a lembrança, insistente, constante da nossa vocação e da nossa projeção universal”, lembrou Carlos César, sublinhando que nunca Soares definiu Portugal “como um País pequeno”. É por isso que o presidente do PS se orgulha de o ter tido como “militante número da democracia portuguesa”, como ontem disse Ferro Rodrigues, nos claustros dos Jerónimos.
Na hora em que o Parlamento se despediu de Mário Soares, uma máxima de Nélson Mandela ecoou no hemiciclo. “A morte é inevitável. Quando um homem fez o que considera seu dever para com seu povo e seu país, pode descansar em paz”. Por isso, concluiu André Silva, o deputado único do PAN, “Descansa em Paz, Mário Soares”.