Naquele dia de maio de 2015, às 10h15 da manhã, Maria estava como habitualmente a limpar o edifício da PT em Vila do Porto, na ilha de Santa Maria, nos Açores. J., funcionário da empresa há 19 anos, ajudou-a a deitar lixo fora e a fazer a reciclagem. Até que entretanto se deu um acontecimento extraordinário e inesperado. Enquanto varria o chão do armazém, uma antiga cozinha do edifício, Maria ouviu baterem no vidro da janela que estava aberta. Quando olhou, viu J. a mostrar os órgãos genitais. “Eu olhei para ver o que é que ele queria… Quando eu o vejo deitar a mão à braguilha e deitar o pénis para fora.” Assustada, fugiu daquela divisão em busca de auxílio, contando o ocorrido ao chefe de J. De seguida, saiu do edifício e comunicou a situação à empresa, recusando-se a prestar serviço no local enquanto aquele funcionário lá estivesse, por temer que viesse a ter outras condutas de teor erótico. “Fiquei muito nervosa, porque com a idade que tenho nunca me vi numa situação dessas.”
Na sequência dos acontecimentos, a empresa invocou justa causa para despedir o trabalhador. J. não se conformou e levou o caso aos tribunais, alegando ter exercido sempre as suas funções “com brio e zelo profissional exemplares”, com “honestidade e lealdade” e mesmo “com sacrifício pessoal” e que nenhuma das testemunhas arroladas tinha presenciado os factos. O primeiro chamado a decidir foi o tribunal de 1ª instância, que acreditou que a versão da funcionária da limpeza era “sincera” e “emotiva” e concluiu que “o comportamento do trabalhador, que se traduziu na exibição do seu pénis, no tempo e local de trabalho, a uma trabalhadora de uma empresa terceira, que procedia, na altura, como era habitual, à limpeza das instalações da entidade empregadora” era “um comportamento grave, voluntário, intencional, culposo e (presumivelmente) causador de prejuízos imediatos de imagem para a empresa”. Além do mais, acrescentou o tribunal, a conduta colocava “de forma irremediável em causa o vínculo da relação de confiança da empresa para com o trabalhador, não podendo a empresa manter ao seu serviço um colaborador que, de forma ostensiva, ofende e atenta sexualmente contra uma colega que presta serviço à sua entidade patronal”.
J. não se conformou novamente com a decisão e apresentou recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa. Além dos argumentos já antes invocados, acrescentou que “pela sua idade, e face à grave conjuntura do emprego no país e em particular na região onde vive (Açores)” ser-lhe-ia “praticamente impossível conseguir um novo emprego” e que o “estigma social de ser despedido com justa causa num meio tão pequeno como aquele em que reside, em que toda a gente se conhece e sabe da vida dos seus pares”, e onde a sua situação já era “conhecida e comentada em toda a ilha” podia “abalar ainda mais” a sua “frágil estabilidade emocional” e dos seus familiares.
A empresa pegou no argumento de estarem numa ilha para questionar o que seria se entendesse “manter um trabalhador conhecido pelas suas condutas profissionais escabrosas”.
A Relação de Lisboa também não foi sensível aos argumentos do trabalhador despedido. Entendeu que a sua conduta era “altamente censurável”, que “desrespeitou e não tratou com urbanidade e probidade as pessoas que se relacionam com a empresa” e que era por isso praticamente impossível “a subsistência da relação de trabalho”: “Face a esse comportamento grave, voluntário, intencional, culposo e (presumivelmente) causador de prejuízos imediatos de imagem para a PT, para mais numa ilha como Santa Maria, no arquipélago e região dos Açores, não era exigível” que a empresa mantivesse o vínculo de trabalho com um trabalhador que tem uma conduta “sexualmente exibicionista”.