Em política como na vida, nem tudo o que parece é. Jean-Luc Mélenchon, candidato do movimento de extrema-esquerda França Insubmissa, foi ontem prova disso mesmo. No comício de lançamento da sua campanha, perguntou, em palco: “Onde estou? Em Lion?”, levando os 12 mil simpatizantes que se encontravam na sala a gritar a plenos pulmões “siiiiiim!”. Mas a pergunta, que também ecoou em Paris, causou alguma curiosidade..Muita gente se pôs de pé, à procura do candidato que ainda não aparecera na sala. Não era surpresa que apareceria numa imagem virtual, mas não sabiam bem o que esperar.
Não esperaram muito. Um estalar de dedos fez com que Mélenchon, que estava, de facto, em Lion aparecesse, na capital francesa. “E agora, em Paris!”, disse, e a sua imagem apareceu a 500 quilómetros de distãncia, num palco em Aubervilliers, nos arredores de Paris. O candidato e o seu holograma falaram assim, durante mais de uma hora.
Também em Lion, Marine Le Pen falava ao seu eleitorado. “Este é o nosso país!”, gritava a candidata da extrema-direita que partilha com Mélenchon o ceticismo face à União Europeia e a globalização.
Mélenchon chamou-lhe “ignorante”, como chamou “jovem banqueiro” a Emmanuel Macron, o ex-ministro da Economia de François Hollande que “desgraçou milhares de pessoas com a sua participação na Lei [laboral] El Khomri”.
Mas o comício (em duplicado) serviu mais para Mélenchon apresentar as suas ideias e o seu programa, que passa por uma aposta na educação (gratuita dos 3 aos 18 anos), mais investigação e cultura, a saída do nuclear. “E não me venham dizer ‘como é que o financiamos?’. Respondo “e a morte e a parvoíce, quanto custa?”
A brincadeira de aparecer em duas cidades ao mesmo tempo ter-lhe-á custado entre 30 mil e 40 mil euros. A imprensa gaulesa garante que foi o primeiro político, em França, a usar a artimanha. Mas já em jeneiro de 2014, o primeiro ministro turco, Recep Tayyip Erdogam, havia recorrido a uma imagem virtual para discursar (em diferido) num comício, na cidade de Esmira, onde não poderia estar pessoalmente. Também o indiano Narenda Modi usou um holograma para chegar a parte do seu vasto eleitorado, durante a campanha de 2014.
Com esta aparição, Mélenchon mostrou ser o candidato com maior avanço tecnológico da campanha para as eleições francesas. Mas será suficiente para passar à frente dos outros candidatos de esquerda, Emmanuel Macron et Benoît Hamon? As sondagens dizem que não. Certo é que, seja pelas suas aparições virtuais ou por outras ordens de razão, tanto Erdogan como Modi foram eleitos, nos idos de 2014.