Por inconsciência ou arrojo, Simão Cayatte pôs sobre os ombros de um ator estreante adolescente todo o peso da sua primeira longa-metragem. Uma enorme ousadia que serve, logo à partida, para destacar como maior mérito de Vadio trazer para o mundo do cinema o nome de Rúben Simões, estudante de uma escola secundária de Sines, que, segundo o realizador, estava mais interessado em jogar à bola do que em fazer filmes.
Talvez Cayatte tenha sustentado o risco na autoconfiança natural de quem primeiro apostou em Alba Baptista – a sua curta Miami (2014) marcou a estreia no ecrã daquela que se tornou uma das mais requisitadas atrizes portuguesas. Aqui, diga-se, o risco é ainda maior, por se tratar de uma longa-metragem com um elevado nível de dependência do desempenho do protagonista, num papel bastante difícil.
Neste fascínio pela adolescência, o realizador foi beber a alguma escola do realismo social, como a dos irmãos Dardenne, ou aos exemplos portugueses de Teresa Villaverde e João Salaviza. Contudo, Cayatte apresenta duas diferenças decisivas.
Em primeiro lugar, coloca a ação fora dos grandes centros urbanos, num Alentejo profundo e desertificado, um pouco ao estilo do Velho Oeste. Depois, porque a ideia de realismo social não parece interessar-lhe assim tanto. Ou seja, o substrato político e ideológico, também existente, é subalterno às questões emocionais e psicológicas. Não sobressai aqui uma ideia de luta de classes ou injustiça social, mas antes de violência emocional e psicológica.
Cayatte conta a história de um adolescente que vive sozinho com o pai numa casa perdida em nenhures, no Alentejo. O isolamento emocional sobrepõe-se ao geográfico. Quando o pai, por motivos externos, decide abandonar o filho, constrói-se uma história de solidão e luta pela sobrevivência. Em espelho, Sónia (Joana Santos) é uma mulher a quem foi tirada a filha, fruto de um deslize parental. Eles encontram-se. E a grande questão do filme acaba por ser se até duas almas incompletas conseguem criar uma família improvisada.
Vadio > De Simão Cayatte, com Rúben Simões, Joana Santos e Carlos Afonso > 91 min