Rita Azevedo Gomes há muito que explora os pontos de contacto entre o cinema e o teatro. Mas nunca tinha levado essa ideia tão longe como em O Trio em Mi Bemol, sobretudo a nível do despojamento da mise-en-scène e da desconstrução narrativa.
Trio em Mi Bemol é a única peça escrita por Éric Rohmer, nome maior do cinema francês. Mas a peça de Rohmer é aqui, mais do que um texto, um pretexto. A realizadora explora sem pudor duas camadas: a história que está a ser contada e os atores que a estão a contar. De forma natural e simples, intercala estes dois campos, como se estivesse constantemente à procura do momento mágico em que o ator se transforma em personagem.
O Trio em Mi Bemol é um filme de uma leveza etérea, quase flutuante, e isso consegue-se através de um minimalismo formal com a ajuda de dois importantes elementos: a música (de Mozart e não só) e, sobretudo, a casa desenhada por Siza Vieira que serve de décor.
A arquitetura isola-nos do mundo e quase que exige os planos abertos (opção da realizadora há muito), que permitem a apreciação global do cenário e dão ao espectador o poder de decidir para onde direcionar o olhar. Em vez de ser um espaço fechado, a casa abre-se como as asas de um pássaro, fazendo com que o isolamento das personagens não seja um restringimento, uma autoflagelação, mas antes uma libertação.
A história em si, fala-nos dos pequenos prazeres da vida, de afinidades e afetos, através do reencontro de um casal de índole poética. Assinalem-se as belas interpretações de Pierre Léon e, sobretudo, de Rita Durão.
O Trio em Mi Bemol > De Rita Azevedo Gomes, com Rita Durão, Pierre Léon e Ado Arrieta > 127 min.