As reflexões sobre a dança e o seu significado na atualidade têm acompanhado as criações de Marco da Silva Ferreira. Em Carcaça, o coreógrafo e bailarino foca-se no contributo da dança para a construção de uma identidade coletiva e questiona o quanto essa herança não resulta de uma cristalização cultural. Marco aponta o facto de “expressões populares, como o folclore, terem sido apropriadas por forças externas, por um governo paternalista que, durante o Estado Novo, impunha códigos; o folclore já não representava ninguém”. Apesar de ter consciência de que não consegue libertar-se do lugar e do tempo em que nasceu, também pergunta: “Qual é a minha responsabilidade perante esta herança?”
Carcaça, metáfora do que fica de um corpo vivo, navega entre passado e presente. “Não pretendo fazer um neofolclore, nem agarrar nos códigos do folclore tradicional, em toda aquela ilustração e figuração. E também não quero encontrar novos símbolos. Pretendo só falar sobre este perigo da cristalização das identidades coletivas e incentivar um espírito crítico sobre quem somos agora e o que tentamos preservar imaculadamente.”
As danças de rua contemporâneas e o clubbing são usados como referências, numa coreografia em que há um marcado trabalho de pés. O elenco de dez intérpretes, muito heterogéneo, representa um corpo coletivo em que as identidades individuais continuam a ter uma voz. A ditar o ritmo, ao vivo, estão a percussão de João Pais Filipe e a música eletrónica de Luís Pestana, com baterias e sintetizadores a cruzarem-se com vozes humanas, gaitas de foles e outros instrumentos tradicionais.
Carcaça > Centro Cultural de Belém > Pç. do Império, Lisboa > 27-28 out, qui-sex 21h > €12 a €20