Perante uma extensa plateia, Emmanuel Macron, o Presidente francês, responde às perguntas dos jornalistas. Na primeira fila, irrequieta e desatenta, senta-se France de Murs, repórter vedeta da televisão francesa. Interpelada pelo Presidente, ela acaba por fazer uma pergunta, para logo depois se distrair novamente, retomando uma mímica de obscenidades feita à distância com a sua assistente. No final, todos comentam a troca de olhares entre a repórter e o político.
Esta é a abertura ousada do filme de Bruno Dumont. O realizador usa imagens de arquivo e, através de uma montagem hábil, coloca France a contracenar com o próprio Macron, como se este tivesse sido contratado para um pequeno papel. Semioticamente, o nome da repórter abre o caminho a leituras espirituosas: há uma troca de olhares entre o Presidente e a França, só que França não lhe liga nenhuma.
France não é propriamente a França mas, antes, um retrato impiedoso de jornalismo-espetáculo, personificado numa repórter ofuscada pela sua própria imagem, diluindo fronteiras entre a realidade e a ficção. Nas reportagens de France de Murs, a ideia de Teatro de Guerra ganha sentido literal. Tão ou mais importantes do que a guerra que se reporta são os elementos cinematográficos, de luz, enquadramento e som nos cenários escolhidos… Além da criação da imagem de uma repórter protagonista e estrela mediática.
Sobre este fundo, Dumont vai desenhando círculos de densidade psicológica, de conflito interno, que acrescentam ao filme uma dimensão extra de drama interior. France é um registo ousado e atípico do francês Bruno Dumont, mais próximo do estilo de alguns filmes do seu compatriota François Ozon do que da imaginação doentia e empolgante das suas obras anteriores, como O Pequeno Quinquin.
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France > De Bruno Dumont, com Léa Seydoux, Blanche Gardin, Benjamin Biolay, Emanuele Arioli > 133 min