Talvez o Festival de Veneza tenha sobrevalorizado o último filme de Daniele Luchetti ao selecioná-lo para a sua abertura. Contudo, seria exagerado não reconhecer que Laços de Família tem motivos de interesse. E se há quem acredite que a maioria dos filmes se define nos seus últimos 20 minutos, neste caso é mesmo o final que trata de salvar uma narrativa frouxa, dando-lhe uma lufada de inteligência e originalidade.
É verdade que os dramas familiares não são de abordagem fácil, embora seja terreno para algumas obras brilhantes. Além de Bergman, que tão genialmente abordou a vida de casal e suas tortuosas relações, recordemo-nos, para dar um exemplo italiano recente, de Tommaso, excelente filme de Abel Ferrara. Luchetti não chega aos calcanhares de Bergman nem aos joelhos de Ferrara.
Laços de Família é um filme sobre o desamor, com uma história pouco trabalhada e algo banal: um homem que abandona mulher e filhos por uma paixão e, anos depois, regressa a casa para viver uma relação sinuosa com a mulher para o resto da vida, implicando grande sofrimento e ressentimento dos filhos. Tudo se passa entre Nápoles e Roma. E as personagens, de início, até se tornam algo irritantes – ele, por um charme de agressor vitimizado em que dificilmente vislumbramos encanto; ela, por um desespero quase ao nível da caricatura, que tão-pouco nos consegue convencer. Há algum interessante dispositivo narrativo, em que se cruzam com agilidade tempos diversos da relação, mas, acima de tudo, há esse surpreendente pedaço final.
Curiosamente, Laços de Família estreia-se no mesmo dia que Contos de um Verão Negro, uma ousada tragicomédia italiana assinada por Damiano e Fabio D’Innocenzo, com bons elementos e algumas fragilidades, que também se centra em dinâmicas familiares. Ambos parecem querer afirmar, de forma veemente, o efeito ricochete das faltas da paternidade.
Veja o trailer do filme
Laços de Família > De Daniele Luchetti, com Alba Rohrwacher, Luigi Lo Cascio, Laura Morante, Silvio Orlando > 100 minutos