Na procura da imensidão que precede o caos, Carlos Reygadas escreveu um poema à potência bruta da Natureza e ao lado vil do amor. Numa herdade mexicana, Juan e Esther criam touros de combate. Ele é um poeta de fama mundial, ela ajuda na gestão da propriedade e dos três filhos do casal
“Um touro bravo é sempre um problema numa ganadaria.” É assim o amor de Juan e Esther, como um touro bravo que, sem estribeiras, corre em busca de liberdade, em direção ao arame farpado mortal de um matrimónio aberto. O acordo sincero, que prevê a possibilidade de Esther ter relações com outros homens, desde que não minta ao marido, gera conflitos que aumentam uma fratura há muito latente entre os dois.
É na ferida dilacerante que rasga a pele de quem ama que Reygadas quer pôr o dedo, e fá-lo com uma sinceridade desarmante, interpretando, juntamente com a mulher e os filhos, as personagens principais do filme O Nosso Tempo. O realizador explora a crise matrimonial numa obra sofrida que, como as enxurradas tropicais que banham a herdade, no final do verão, lavam a alma, inquietando-a ao mesmo tempo.
Será o Homem capaz de querer genuinamente a felicidade plena daqueles que ama? Será Juan capaz de suportar a entrega da mulher a outro homem, sem repensar os limites que definem o que é o amor? As personagens rebentam como clarões de luz, para lá do nevoeiro. Ao longo das quase três horas de filme, o espectador vê o mundo através dos seus olhos, num alternar de planos fechados, quase sufocantes, com planos abertos, em que a imensidão da planície mexicana é revelada em tons de prata e chumbo.
Ao ronronar dos motores, das angústias, da música de timbales opõem-se as fileiras de choupos, as montanhas, a água lamacenta que, muda, acolhe o desenrolar da vida na herdade. O interior e o exterior colidem, enquanto, como touros na lama, Juan e Esther lutam por sobreviver.
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O Nosso Tempo > De Carlos Reygadas, com Carlos Reygadas, Natalia López, Eleazar e Rut Reygadas > 173 min