Há quem fique impressionado com as parecenças físicas entre Sérgio Praia, ali em palco, e o músico António Variações, que o ator interpreta na peça escrita e encenada por Vicente Alves do Ó, Variações, de António – mas não é com isso que os dois criadores se preocupam. “Não sou o António nem nunca vou ser, o mais importante para mim é celebrar quem ele foi”, diz Sérgio Praia. Para interpretar a personagem e este monólogo, inspirou-se na respiração de Variações, em tudo o que leu e ouviu sobre o músico, foi conhecer o lugar onde nasceu, viu-o vezes sem conta em fotografias e vídeos, tentou perceber como é que ele se construiu como artista mas também como homem, de onde veio a sua voz, de onde vieram as roupas, o que absorveu de Londres e de Nova Iorque. “Nada nele era plástico, nada era falso, por isso o adoramos tanto”, conclui.
A ideia desta peça partiu de Sérgio Praia, que tem outro projeto de um filme sobre António Variações que tarda a reunir as condições para ser feito. “Está a demorar e tinha que pôr este tema cá para fora”, conta o ator. Convite feito a Vicente Alves do Ó (argumentista e realizador do filme Florbela, sobre Florbela Espanca) e os dois mergulharam ainda mais no universo do músico de uma pequena aldeia de Amares, chegado a Lisboa aos 12 anos, para trabalhar. “Eu, o Sérgio e o António somos uma trindade”, diz Vicente Alves do Ó, sublinhando o que os liga aos três: “Nascemos em lugares pequenos e viemos para a cidade, determinados a cumprir os nossos sonhos, focados e sem vacilar nem desistir”.
Em cena, o dia em que António Variações deu um concerto no Coliseu, fazendo a primeira parte de Amália, que o músico considerava a ser a sua inspiração para cantar. “Deve ter sido um momento em que imensa coisa lhe passou pela cabeça”, nota Alves do Ó, que encontrou assim o mote para a peça. Ator e encenador sabem que não é tarefa fácil este Variações, de António, mas estão dispostos a enfrentar as ideias feitas que todos temos com as suas próprias ideias. Por isso, ao palco, sobe um homem humilde, “capaz de comer o atum de uma lata”, mas também alguém que tem dentro “um cavalo que não o deixava parar nunca”, sublinham. Um homem frágil, por vezes, mas muito sólido, apontam, capaz de cumprir o sonho de ser músico, apesar das dificuldades e dos preconceitos com que teve que lidar. Aqui o vemos, exposto, sozinho no palco, em confissão quase.
Variações, de António > Sala Mário Viegas > Teatro Municipal São Luiz > R. António Maria Cardoso, 38, Lisboa > T. 21 325 7650 > 24 jun-10 jul, qua-sáb 22h, dom 17h30 > €5 a €12
Também no Teatro São Luiz, mas no Jardim de Inverno, estará André Murraças com duas propostas A Propósito de António Variações: a instalação cenográfica António Lisboa-Nova Iorque (1-10 jul, qua-dom 18h-20h, grátis) descrita como “uma caixa mágica” onde o espectador pode entrar; e duas noites de danceteria a evocar os anos 80 com os atores Cláudia Jardim e Francisco Goulão e o dj Andy Punch (2 e 9 jul, sáb 23h30, grátis).