Há mais de 20 anos, Rui Horta teve um sonho. O sonho de uma peça perfeita, com todos os ingredientes para a tornar inesquecível, mas que, logo ao acordar, se desvaneceu e se transformou em farrapos. A memória desse sobressalto criativo nunca o abandonou e servirá agora de motor para o seu novo espetáculo, Cabul, o primeiro enquanto artista associado da Orquestra Metropolitana de Lisboa (OML), que sobe ao palco do Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães, esta sexta e sábado, dias 30 e 31 (e que chega ao Teatro Municipal São Luiz, em Lisboa, em março de 2016).
Como é habitual no criador, não é uma peça de classificação fácil. Rui Horta reescreve excertos de A Missão – Memórias de uma Revolução, do dramaturgo alemão Heiner Muller, nomeadamente, o monólogo da personagem Sasportas, o homem que trabalha numa cave e é convocado para se encontrar com o superior hierárquico no seu escritório, alguns andares acima. Ao entrar no elevador, dominado pela tensão, antecipa cenários e missões, mas as portas abrem-se para território desconhecido: Cabul, a capital do Afeganistão, sinónimo de guerra, destruição e desespero. Aqui, fora da sua zona de conforto, é obrigado a confrontar-se com ele mesmo, com os seus medos e limites. “Isto é o estado do mundo, vivemos como formigas nos carreiros, mas mais tarde ou mais cedo os nossos sonhos vão parar ao elevador e tudo pode acontecer”, diz Rui Horta. A ação é conduzida pelo ator Pedro Gil, ao longo de um espaço cénico imersivo, feito de paletes iluminadas colocadas em círculo, com o público no centro dos acontecimentos. “É importante criar outras perspetivas para deixar fluir a peça”, defende o encenador.
A acompanhar o texto, estará a música do compositor norte-americano Morton Feldman. Piano And String Quartet (1985) e For Samuel Beckett (1987) serão as obras interpretadas pela OML, conduzida pelo maestro Pedro Amaral. Segundo Rui Horta, “houve uma relação de grande cumplicidade, entendeu perfeitamente o que procurava e foi ao meu encontro, com a orquestra a servir este propósito de uma obra completa”.
Cabul > Centro Cultural Vila Flor > Av. D. Afonso Henriques, 701, Guimarães > T. 253 424 700 > 30-31 out, sex-sáb 22h > €10