Em 1961, já instalada em Madrid, Ava Gardner (1922-1990) representava tudo o que era proibido numa sociedade conservadora liderada por um ditador. As festas madrugada dentro, em sua casa (a tirar o sono ao ditador argentino Juan Perón, recentemente exilado) ou no Dolce Vita, um dos mais badalados clubes noturnos da cidade, as drogas e o álcool, os homens e o desejo sexual, o glamour e a decadência de mãos dadas.
Perto dos 40 anos, a atriz americana – que já ia no seu terceiro divórcio, o último de Frank Sinatra – estava insatisfeita com a indústria em Hollywood e dá assim início à internacionalização da sua carreira, que na verdade assentou sempre mais na sua beleza do que no seu talento. Em Arde Madrid (2018), uma criação e realização de Paco León e Anna R. Costa para o canal Movistar+, a passagem de Ava Gardner, interpretada pela nova-iorquina Debi Mazar (presença habitual em videoclips de Madonna), pela capital espanhola é apenas o pretexto para traçar o retrato de uma época de plena repressão sexual.
Desconfiado das reuniões das elites artísticas em casa de Ava Gardner, o regime arranja forma de a espiar. Pelo olhar do casal de empregados, os infiltrados Ana Mari e Manolo, governanta e motorista, os oito episódios abordam uma sociedade virgem em alguns temas, como a contraceção, o aborto, o adultério, a masturbação e a homossexualidade. O dramatismo do preto-e-branco contrasta com a banda sonora cheia de salero, dando um forte tom de comicidade à série, que passa na RTP2, em episódio duplo, aos domingos.
Paco León (La Casa de Las Flores) também interpreta Manolo, um contrabandista sedutor, machista e viril que gosta de se gabar do adultério. Ana Mari (Inma Cuesta) é uma mulher honesta, habituada a ensinar as jovens a serem boas esposas. Um mês depois de o casal estar a trabalhar em casa de Ava, já esta fala castelhano: “no estoy muy católica” é das frases mais proferidas na ressaca do dia seguinte. Arriba, España!
Arde Madrid > Dom 21h55