Toca o despertador e são quatro da manhã. Podiam ser insónias, simplesmente. Mas, não. É preciso estar pronto a horas. Na receção do Convento do Espinheiro aguarda-nos uma boleia da Fita Preta, a adega situada a oito quilómetros deste hotel em Évora. Segue-se uma viagem de 45 minutos até à vinha Vale do Cepo, no Redondo, mesmo no sopé da serra d’Ossa. Plantada há 50 anos, caso raro na região, fica numa zona fresca, por onde passam dois riachos e de grande exposição solar. Nesta terra, o enólogo António Maçanita, um apaixonado pela genealogia das castas, já descobriu algumas desconhecidas como Alicante Branco ou Bual, Trincadeira das Pratas ou Tamarez e Tinta Carvalha. Mesmo sendo uma zona fresca, todas as vinhas da Fita Preta são de sequeiro: “Ou sobrevivem assim ou não são sustentáveis. Queremos captar as suas características mais genuínas”, explica-nos Alexandra Maçanita, mulher do enólogo. Só nesta vinha estão identificadas 10 a 12 castas de uva toda ela biológica e certificada.
A vindima começa de madrugada, ainda de noite, a caminho do nascer do sol. Todos os participantes, mais ou menos experientes, juntam-se ao “rancho” dos trabalhadores. Sem qualquer tipo de teatralização, os participantes são inseridos no grupo de trabalho e mãos à obra, todos os sentidos são chamados à ação. Só as mulheres vindimam, os homens carregam as caixas. Se for noite de lua cheia quase não é preciso ligar as lanternas presas na testa. A experiência de uma alvorada, com uma frescura inigualável, será uma das melhores recordações.
Escapar às altas temperaturas que ali se fazem sentir e que são um problema para trabalhar, tornou-se na solução para também preservar a uva até ser processada.
“Onde está a uva do rosé?”, “Como cortar o cacho?” ou “Misturam uva tinta com branca para fazer rosé?” são as dúvidas mais comuns de quem só está acostumado a beber o vinho.
Já passa do meio-dia e à nossa espera está José Inverno, da Herdade da Maroteira, viticultores da Fita Preta. Da vinha ao montado são quatro quilómetros, uma antiga zona habitada por ermitas. Ali, andamos no meio de uma floresta naturalista, numa propriedade com 540 hectares, dos quais 480 são de sobreiros, que todos os anos dão cerca de 50 toneladas de cortiça. Há árvores com 300 anos. A pausa para a bucha (com queijo, presunto, pão e vinho), depois de um passeio num jipe descapotável pelo montado, vem mesmo a calhar.
Quem não conseguir participar na vindima da Fita Preta pode, no Paço do Morgado de Oliveira, onde fica a adega, reservar lugar debaixo de uma árvore. O novo programa Wine Under the Tree (€20/pax, mais o vinho) tem à nossa espera uma cama com mosquiteiro e almofadões, duas cadeiras e uma mesa. Basta comprar a garrafa de vinho e com ela vêm queijo, tomate, frutos secos, bolachas, tostas e pão para um pequeno repasto à sombra do sol escaldante alentejano. E, debaixo do sobreiro, é inevitável passar pelas brasas.
Fita Preta > Paço do Morgado de Oliveira, EM527 Km10, Nossa Senhora da Graça do Divor, Évora > T. 91 358 2547, 91 826 6993 > Vindima Fita Preta seg-sáb €400 (2 pessoas); Wine Under the Tree (€20/pax, sem vinhos)