Quantas vezes não se rendeu ao embasbacamento provocado pela monumentalidade do edifício da Rua do Ouro com o nome esculpido do extinto Banco Totta & Açores? As varandas ornamentadas em meia-lua, as colunas de inspiração coríntia, a fachada com motivos florais… Estamos a esquecer-nos de algo? Ah, as impressionantes cabeças de leão com patas pousadas na pedra, criadas pelo escultor Jorge Pereira, que ajudaram ao batismo do Edifício dos Leões. A “rugirem” desde 1905, altura em que o arquiteto Miguel Ventura Terra (1866-1919), quatro vezes galardoado com o Prémio Valmor de Arquitetura, remodelou o velho prédio seguindo a imponência da Velha Europa, com o objetivo de aí abrigar um banco e modernizar o desenho arquitetónico da Baixa. Um século e uns trocos depois, outra instituição financeira propõe-se criar novas narrativas e devolver este tesouro ao espaço público.
Arte contemporânea e revisitação histórica constituem o projeto agora assumido no Edifício dos Leões – Espaço Santander. Podem visitar-se as salas com cheiro a madeira antiga e brilhos de latão, a ampla escadaria e a claraboia própria de um salão de baile, o balcão do antigo banco, com uma fotogénica central telefónica (vulgo PBX) por perto, e uma banda sonora com diálogos da época entre clientes e um funcionário da agência, as tapeçarias penduradas… Contemplam-se ainda 70 obras de arte do espólio do Santander, que inclui Almada Negreiros, Júlio Pomar, Malhoa, Menez, Silva Porto e Vieira da Silva. E é-se sacudido de volta para o século XXI perante a presença de 16 peças de grande escala de Joana Vasconcelos, a exposição temporária Lar Doce Lar, instalada performaticamente pelos três andares até 17 de maio. Quem visitou, por exemplo, a mostra da artista portuguesa no Palácio da Ajuda, reencontrará o choque familiar entre cenários “congelados” no seu tempo histórico e a irrupção de criaturas e objetos revestidos de renda. Caso do candeeiro Carmen (2001), do sapato de tachos Cinderela (2007), do Piano Dentelle #3 (2016), do chuveiro Mãe d’Água (2019), ou dos vários insetos e lagostas gigantes – ou seja, surrealismo a subverter tradição, o que é sempre bom de ver.
O Edifício dos Leões manterá as portas abertas ao público, e permite fazer visitas guiadas para escolas e outros grupos de interessados, sempre à terça-feira, entre as 10h e as 11h30, mediante marcação.
Edifício dos Leões – Espaço Santander > R. do Ouro, 88, Lisboa > T. 21 052 9951 > ter-sex 12h-19h, sáb-dom 12h-20h > €8