Há grandes livros sobre a perda que preferem a lucidez à autopiedade ou ao exibicionismo emocional. Como O Ano do Pensamento Mágico, ato de exorcismo narrativo da norte-americana Joan Didion sobre essa época em que a sua filha única, Quintana, adoeceu e ficou em coma, e o marido de quatro décadas, John Gregory Dunne, morreu subitamente quando regressava duma visita ao hospital. “A morte, para quem escreve, é um tema quase inescapável”, reiterou, em entrevista, Marta Orriols, nascida em 1975, formada em História da Arte. Foi igualmente a morte do marido que a impulsionou a escrever Aprender a Falar com As Plantas, romance que disseca o torvelinho emocional causado pela perda – com autenticidade, desembaraço, atenção aos nadas quotidianos como figurantes catalisadores de qualquer tragédia, uma escrita descomplicada e sem complacências mas dotada de subtis fulgurações.
“Aprender a Falar com As Plantas” (D. Quixote, 240 págs., €14,90), segundo livro de Marta Orriols, chega às livrarias portuguesas a 11 de fevereiro e será o tema das conferências que a autora catalã dará a 10 e a 17 de fevereiro, às 18h30, no El Corte Inglés, em Lisboa.
Orriols fá-lo também com uma boa personagem: Paula Cid, 42 anos, neonatologista, filha de um terno pai setentão que a criou sozinho, criatura com falhas que, aqui, enfrenta duas espécies de luto. Mauro, o companheiro de muitos anos afetados pela tepidez da familiaridade e algumas batalhas perdidas, confessa-lhe, num almoço à beira-mar, que tem outra relação. Horas depois, é atropelado por um carro que não respeitou um sinal vermelho. “Quem herda um morto com o acréscimo de uma infidelidade sabe coisas que os outros ignorarão sempre, como a impossível regulação da calma”, pensa ela.
Saltando entre o presente e o passado, o livro revela exemplarmente todo o processo de luto: a aversão ao vocabulário piedoso dos outros, as saudades, a humilhação das mensagens de telemóvel entre amantes, o sexo de vingança, o “e agora?”, as manifestações do “raio de influência” de Mauro que a apanham à traição (um bilhete de cinema, os óculos cor “Havana escuro”, o terraço de plantas de que ele cuidava), a esperança primaveril…