Poucos autores de policiais têm tido tamanha sorte nas adaptações cinematográficas dos romances como Lehane: Mystic River foi trabalhado cirurgicamente por Clint Eastwood, Shutter Island elevou-se segundo a batuta de Martin Scorsese, Gone Baby Gone transformou-se num fenómeno popular via Ben Affleck. Talvez isso se deva sobretudo a um talento assinalável: o de reunir a atmosfera evocativa e as frases carregadas de desencanto, que ecoam a tradição do noir chandleriano, com um retrato contemporâneo das cidades americanas, desiludidas, deprimidas, e do seu melting pot.
Moonlight Mile – A Última Causa (Porto Editora, 288 págs., €16,60) trabalha essa mesma dualidade com mestria, acrescentando-lhe uma camada: recupera personagens e linha narrativa de Gone Baby Gone, 12 anos depois dos acontecimentos em torno do desaparecimento de uma menina de quatro anos e da sua entrega a uma mãe incapaz. Aos 16 anos, Amanda voltou a esfumar-se. O casal de investigadores Patrick Kenzie e Angie Gennaro, endivididados e divididos entre consciência e cumprimento da lei, enfrentam as consequências do passado, tendo, como paisagem de fundo, a ressaca das esperanças excessivas em Obama e a crise causada pela bolha do imobiliário.