Um rasto de poeira é deixado pelo jipe, enquanto atravessa esta propriedade única, de 400 hectares, combinando vinha contínua (200 hectares, a maior do Douro) com mata mediterrânica, olival e linhas de água, acompanhadas de galerias ripícolas. Um ecossistema riquíssimo, pontuado por arbustos, como a esteva, o rosmaninho e a urze, além de espécies florestais, como o sobreiro, a azinheira e o medronheiro, que povoam a densa mata. Ali, escondem-se espécies protegidas, como o milhafre-real, a águia-calçada e o abelharuco, e cinegéticas, como o javali, a raposa, o corço, o coelho-bravo e o pombo–torcaz. “Não podíamos guardar isto só para nós, tínhamos de permitir que as pessoas usufruíssem deste pedacinho de paraíso”, sublinha o intrépido condutor do jipe, Jorge Dias, diretor-geral da Gran Cruz, líder nas exportações do vinho do Porto, que, em 2014, adquiriu a Quinta de Ventozelo. O orgulhoso guia, atento a todos os pormenores, revela um envolvimento profundo no projeto enoturístico. “Tivemos uma equipa multidisciplinar a preparar o programa de intervenção, durante dois anos”, recorda. A assinatura do hotel é, precisamente, “Ventozelo, o Douro numa quinta”.
Com mais de 500 anos de História, a quinta é o exemplo máximo do esplendor duriense. “Há uma riqueza patrimonial, e aqui não falamos de palácios, porque o Douro não é isso, mas da complexidade vernacular das construções. Quisemos restituir a dignidade a esse património”, conta Jorge Dias. Nada foi construído de raiz. Sete edifícios antigos, espalhados pela quinta, foram reconstruídos, com as mesmas técnicas de construção e volumetrias (o projeto é do arquiteto Carlos Santelmo), para acolher os 29 quartos, mantendo-se a simplicidade arquitetónica das construções agrícolas e acrescentando-lhes conforto. “Existem decorações diferentes para cada estrutura, inspiradas no anterior uso das casas”, explica o guia. Diferenças subtis, como o estilo mais rural dos sete quartos da Casa dos Cardanhos, que acolhia as camaratas dos trabalhadores, ou a oferta mais exclusiva, semelhante a um pavilhão de caça, da Casa Grande, pensada para grupos, numa área mais reservada da propriedade, com piscina própria. Há ainda adaptações curiosas, como as feitas em dois balões de armazenamento de vinho, transformados em amplas suítes. Com um azul-vivo, único, a rematar portas e janelas.
Aberta a não hóspedes está a Cantina de Ventozelo, com consultoria do chefe de cozinha Miguel Castro e Silva, um conhecedor das tradições gastronómicas da região. O restaurante apoia-se num receituário enraizado na zona de influência hidrográfica do Douro, de Trás-os-Montes até à Beira Alta, recorrendo aos produtos cultivados e produzidos em Ventozelo (alguns vendidos na mercearia do hotel), da horta biológica à caça, mas também às trocas com quintas vizinhas ou a fornecedores próximos. Comida de conforto, servida num ambiente descontraído, especialmente aos almoços, com sopa preparada no pote de ferro, na lareira sempre acesa no exterior, prato principal e sobremesa.
Não existe uma carta: quem chega come o que a terra dá e o que é preparado para aquele dia. À mesa, tanto pode aparecer um peixe pescado no Douro como o tomate-coração-de-boi colhido na horta ou os espargos selvagens apanhados junto à ribeira de Ervedosa, que atravessa a propriedade. Ao jantar, a oferta mantém-se fiel ao espírito da quinta, havendo dois pratos principais, como pescada com milhos, vitela com arroz de grelos, bacalhau ou naco de vitela, e a sopa, sempre a sopa. Há ainda a Chef’s Table, uma refeição preparada no forno e na grelha a lenha, acompanhada ao vivo por quem se senta na mesa comunitária do terraço. Pão estaladiço, para molhar no azeite da casa, enchidos, folar de carnes, sopa seca, truta salmonada com presunto e javali podem estar entre as iguarias. O Douro feito brasa.
Dentro da quinta: Para hóspedes e não só, não faltam atividades
Percursos pedestres
Existem sete trilhos para quem queira conhecer a riqueza natural da quinta, todos eles com cerca de dois, três quilómetros, dependendo da dificuldade (reduzida ou média) do declive do terreno. Caminhos entre as vinhas, junto ao leito e à galeria ripícola da ribeira de Ervedosa, pela margem do rio Douro ou atravessando as áreas de exploração silvícola e cinegética de Ventozelo. Em breve, estarão disponíveis mapas e audioguias, para visitas livres à propriedade. No final do passeio, há uma prova de três vinhos. Marcações T. 254 249 670 > todo o ano, das 10h-18h > grátis para hóspedes, adultos €50-€75, crianças €25-€37,50
Turismo de Natureza e atividades cinegéticas
Exclusivamente para hóspedes, existem passeios noturnos, observação de aves e de outras espécies, e também se aproveita o facto de parte da quinta ser reserva de caça, com uma equipa especializada a acompanhar atividades como a caça ao javali por espera, as largadas de perdizes e de faisões e a caça por falcoaria. Marcações T. 254 249 670 > preços por consulta
Centro Interpretativo de Ventozelo
Além de contar a história da propriedade, cuja ocupação humana remonta ao Império Romano, o centro oferece uma experiência sensorial, com câmaras de silêncio onde se isolam os sons da quinta, janelas a emoldurar a paisagem e testes aromáticos. No final, um filme com imagens recolhidas ao longo de dois anos dá conta da vida e dos ciclos da quinta. A visita inclui ainda uma passagem pela capela dedicada à Nossa Senhora dos Prazeres, pelo lagar e o armazém de vinhos. seg-dom 9h-18h > €20 (inclui prova de três vinhos)
Quinta de Ventozelo > Ervedosa do Douro, São João da Pesqueira > T. 254 249 670 > a partir de €115, menu da Cantina de Ventozelo a partir de €35