Passeámos por avenidas e jardins, visitámos galerias e uma casa-museu, descobrimos o campo na cidade, sentámo-nos para um café rodeados de pinheiros e acreditem, é mesmo verdade não nos cruzámos com um único turista.
‘Uma zona com potencial ” é como Vera Appleton define o quarteirão entre a Avenida da Igreja e a Avenida do Brasil, onde há cerca de sete anos abriu Appleton Square 1 .
Pioneira em Alvalade, bairro de avenidas e passeios largos que convidam a dar uma volta, foi numa antiga fábrica de passamanaria (palavra difícil para designar galões, fitas, berloques e outros adornos para sofás e cortinas) que surgiu “um espaço polivalente”, como o descreve, que só uma área generosa, com um pé-direito alto permitiria.
E onde pode acontecer uma grande variedade de eventos: exposições, cursos de arte e arquitetura, lançamentos de livros, conversas com artistas ou concertos.
“O que é interessante é que, numa zona residencial, onde se encontra de tudo em termos de comércio, surja esta área industrial”, explica a galerista. Um sítio onde se assiste a uma revitalização cultural que junta a Fundação Leal Rios 2 , na qual se mostra o trabalho dos seus artistas e que funciona também como ateliê de design, e a Galeria Quadrado Azul (esta já do outro lado da Avenida Rio de Janeiro). E que funciona de acordo com uma agenda concertada no que toca à inauguração de exposições, “chamando, assim, mais pessoas”, justifica Miguel Rios, um dos proprietários da fundação.
Logo ali ao lado, na Rua João Saraiva, também as antigas instalações da Confeitaria da Ajuda, que ali esteve instalada durante mais de cinco décadas, têm novo inquilino. Onde antes se confecionavam amêndoas de tipo francês, confeitos e marmelada, está agora a Fábrica 22, 3 na qual é possível jogar consola e Just Dance, praticar skate, ter aulas de dança ou Boot Camp (treino de estilo militar) e até alugar salas para festas.
Nos 2 mil metros de área, há também lugar para Laser Tag, uma espécie de paintball com réplicas exatas das M4, as armas dos marines americanos, num verdadeiro cenário de batalha, e para uma corrida na pista de karts elétricos. Das várias áreas que se desdobram num percurso mais ou menos labiríntico para quem o não conhece, destaca-se ainda o terraço com bar de apoio que convida a ficar.
Onde também apetece estar é na Casa do Lago, 4 o novo bar e restaurante junto do lago do jardim do Campo Grande. Em dia de semana, não há quem ensaie os dotes de remador num dos 14 barcos para alugar, mas as mesas servem de poiso para uma conversa mais demorada, enquanto se almoça ou para manter em dia o estudo das primeiras matérias do novo ano letivo, ou até para consultar a internet.
Da responsabilidade de Vítor Mah, que ganhou a concessão num concurso lançado pela Câmara Municipal de Lisboa, foi a recuperação do painel original de azulejos do pintor Júlio Pomar, no interior, retirado por segurança durante o tempo em que o bar esteve fechado, bem como a preservação da enorme magnólia que dá sombra em dias de sol, a par dos grandes chapéus brancos.
Ao entardecer, acendem-se as luzes e o jardim ganha uma nova dimensão que se há de prolongar noite dentro, enquanto se servem os jantares.
Tiquetaque, tiquetaque
Numa cidade em que a cultura parece fechar à segunda-feira, a Casa-Museu Medeiros e Almeida 5 pretende ser uma alternativa, abrindo a porta nesse dia da semana. Também à quintafeira, à hora do almoço, há uma Pausa para a Arte, com visitas temáticas gratuitas de 20 minutos, à volta das histórias por detrás de uma peça escolhida da vasta coleção de arte que o empresário português construiu ao longo da vida e “que fez questão de partilhar com o público”, frisa Maria Teresa Cancela Vilaça, diretora da casa-museu. “Tratando, para isso, de assegurar a autossuficiência financeira da fundação que a gere, através das rendas dos imóveis que foi adquirindo no quarteirão entre a Rua Rosa Araújo e a Rua Mouzinho da Silveira”, explica.
Se é na ala acrescentada ao palacete para expor as peças de mobiliário, pintura, escultura, tapeçaria e arte sacra compradas nas mais afamadas casas leiloeiras que começa a visita, é na parte principal onde fixou residência em 1940 que se entra mais na intimidade da vida de António de Medeiros e Almeida e da sua mulher, Margarida, ficando-se a conhecer um pouco mais sobre quem era este homem. De como tinha a preocupação de se manter em forma, pelo exemplar daquela que foi uma das primeiras máquinas de fitness importadas para Portugal, nos anos 50.
De como o casal era meticuloso quando recebia para jantar a alta sociedade da época incluindo os príncipes do Mónaco, em 1964, cuidando do serviço de mesa, da escolha da ementa e dos vinhos e da precedência dos convidados à mesa. Dos seus interesses, através das revistas, livros e inúmeros catálogos de leilões de todo o mundo que enchem a biblioteca e o gabinete de trabalho, ou de como foi reconhecido, pelas condecorações que recebeu em vida. Mas também das suas paixões, como os relógios cujo tiquetaque acompanha todo o percurso da visita.
Tempo é coisa que parece não ter passado pela Casa Veva de Lima 6 , perto das Amoreiras e que serviu de cenário do filme Os Maias, de João Botelho, para representar o Ramalhete. Discreta aos olhares de quem cruza a Rua Silva Carvalho, na mansão extravagante de Genoveva de Lima Mayer, ainda hoje se repetem, por vontade da filha, Maria Ulrich, as sessões literárias que lhe deram fama, mantendo assim viva a sua memória. “As reuniões, hoje dedicadas a outros temas, são abertas ao público, reservando-se o jantar que as precede aos sócios e convivas da Associação Veva de Lima”, explica Alfredo Magalhães Ramalho, que preside à entidade responsável pela organização destes encontros (acontecem uma vez por mês, sempre à quarta-feira). De resto, a casa só pode ser visitada no âmbito do programa Visitas Comentadas, da Câmara Municipal de Lisboa, proprietária do edifício e à qual foi doado o recheio.
Verdes são os campos
Em tarde domingueira, são poucos os que aproveitam a esplanada da cafetaria e restaurante do Clube Internacional de Foot-Ball, o CIF 7 , como é mais conhecido dos que sabem a história do futebol, mas também do ténis. Escondido entre uma mata de pinheiros que acompanha a Avenida dos Bombeiros em direção ao Restelo, o clube, do qual terá de ser sócio para praticar uma das muitas modalidades disponíveis como o padel e o corfebol, está aberto ao público e mantém o charme de outros tempos.
Não muito longe daqui, é um pedaço de campo no meio da cidade, aquele que encontramos na Tapada da Ajuda, 8 antiga coutada de caça real atribuída, em 1910, ao Instituto Superior de Agronomia (ISA). Aqui há vinhas, olival, pomares e campos de cultivo que servem de estudo aos alunos, uma plantação de eucaliptos que alimentam os koalas do Jardim Zoológico de Lisboa, mas também hortas comunitárias às quais se pode concorrer para cultivar um talhão. Há o Observatório Astronómico de Lisboa que organiza palestras e abre as portas ao público em noite de Perseidas, a “chuva de estrelas ” que ocorre em meados de agosto, ou para se observar as luas de Júpiter ou os anéis de Saturno.
Há edifícios do tempo da monarquia por descobrir (como o Pavilhão de Exposições ou o chalé da rainha D. Amélia), as casas de função, ainda hoje ocupadas pelos empregados, como a dona Maria e o senhor Gonçalves, telefonista e carpinteiro do ISA, já reformados. E há ainda um parque de merendas, um restaurante, cavalos garranos que podemos alimentar e um miradouro sobre a cidade e o Tejo.
Tudo isto aberto a quem por ali queira passear, com roteiros que ajudam a descobrir estes 94 hectares que vão de Monsanto até aos pilares da ponte, em Alcântara. Lá de cima, avista-se uma boa parte da cidade. Turistas é que nem vê-los.
MORADAS
- APPLETON SQUARE – R. Acácio Paiva, 27 Alvalade T. 21 099 3660 Ter-sáb 14h-19h
- FUNDAÇÃO LEAL RIOS – R. Centro Cultural, 17 B Alvalade T. 21 099 8623 Qui-sáb 14h30-18h30
- FÁBRICA 22 – R. João Saraiva, 22 Alvalade T. 21 592 0563 Dom-qui 14h-22h, sex-sáb até 24h – www.fabrica22.pt
- CASA DO LAGO – Jardim do Campo Grande T. 21 757 4241 Ter-dom 10h-23h
- BARCOS JARDIM CAMPO GRANDE – 30 min €5 / 1h €7 Seg-dom 10h-18h
- CASA MUSEU MEDEIROS E ALMEIDA – R. Rosa Araújo, 41 T. 21 354 7892 Seg-sex 13h-17h30, sáb 10h-17h €5, sáb 10h-13h grátis
- CASA VEVA DE LIMA – R. Silva Carvalho, 240 T. 21 383 0240
- TAPADA DA AJUDA – PARQUE BOTÂNICO E AMBIENTAL – Cç. da Tapada / R. Jau, Lisboa T. 21 365 3100 www.isa.ulisboa.pt Para visitas guiadas deverá enviar email para gci@isa.ulisboa.pt. Também as festas e piqueniques requerem marcação através do email espacosdatapada@isa.ulisboa.pt
- CLUBE INTERNACIONAL DE FOOT-BALL (CIF) – Av. dos Bombeiros, Belém T. 21 301 4767 Seg-dom 8h-24h (jantares só por marcação)