O cancro do pulmão continua a ser a principal causa de morte, por cancro, a nível mundial. Em Portugal, estima-se que surjam cerca de cinco mil novos casos de cancro por ano, o que representa uma média de 12 portugueses diagnosticados por dia.

De qualquer forma, as taxas portuguesas por 100 mil habitantes são “relativamente baixas”, na opinião do diretor do serviço de pneumologia do Hospital de São João, Venceslau Hespanhol. Ainda assim, o médico sublinha que “o cancro do pulmão é ainda a doença que mais anos de vida útil tira aos portugueses. Cerca de mais de 20 mil por ano, se considerarmos todas as pessoas diagnosticadas nesse arco temporal”.
Na base do problema podem estar várias causas, dos hábitos de vida a fatores genéticos, mas o contacto com o tabaco, seja passiva ou ativamente, parece ser o elemento que mais salta à vista nos pacientes diagnosticados com cancro do pulmão. “Cerca de 75% teve contacto com tabaco”, refere Hespanhol, justificando assim a grande pressão que existe atualmente para que se abandonem os hábitos tabágicos. “O tabaco tem impacto, não só no aparecimento de cancro do pulmão, mas num número enorme de doenças que afetam as pessoas e lhes alteram completamente a vida e a sobrevivêcia”.
O tabaco tem impacto, não só no aparecimento de cancro do pulmão, mas num número enorme de doenças que afetam as pessoas e lhes alteram completamente a vida e a sobrevivêcia
venceslau hespanhol – diretor de pneumologia do hospital de são joão
De facto, apesar de não haver uma percentagem fixa que determina a quantidade do risco de aparecimento de cancro do pulmão causada pelo tabagismo, Venceslau Hespanhol assegura que há uma relação direta com o número de cigarros fumados por dia e, sobretudo, o número de anos de fumo.
“Dois dos estudos mais importantes, publicados em 2013, chegaram à conclusão que um fumador permanente perde 10 anos de vida, mas se deixar de fumar antes dos 40 anos reduz 90% dessa perda, e se for antes dos 30, reduz 97%”.
Mesmo que se deixe de fumar após os 40, o médico assegura que é possível atrasar esta perda de sobreviência, e, por isso mesmo, “qualquer momento é importante para deixar de fumar”. Sobretudo porque, além de cancro do pulmão, o tabagismo pode levar a enfartes do miocárdio, AVCs, cancro da laringe ou da bexiga.
Um fumador permanente perde 10 anos de vida, mas se deixar de fumar antes dos 40 anos reduz 90% dessa perda
VENCESLAU HESPANHOL – DIRETOR DE PNEUMOLOGIA DO HOSPITAL DE SÃO JOÃO
Porém, em cerca de 25% dos cancros do pulmão os médicos não conseguem encontrar associação com o tabaco. “Esses tumores têm características biológicas um bocadinho diferentes. Em muitos deles, podemos encontrar características diferentes das dos tumores do tabaco, nomeadamente mutações que, muitas vezes, associam-se a uma vantagem de grupos de células que as possuem, as quais fazem com elas possam proliferar com uma velocidade muito grande”.
Como prevenir o cancro do pulmão?
A primeira e quase única recomendação de Venceslau Hespanhol é mesmo deixar de fumar. “O tabaco é de tal maneira avassalador no seu impacto de associação causal, que minimiza todos os outros fatores de risco”, explica. Claro que depois há fatores ambientais que Venceslau Hespanhol diz contribuírem para o aumento do número de tumores inalatórios, “como a poluição”. Porém, como também refere o médico “não podemos deixar de respirar”.
Outro fator de risco conhecido é o radão um gás radioativo presente no solo e nos materiais de construção de origem granítica. que existe muito nas casas térreas no Norte do país, e ainda a idade avançada. “O número de tumores aumenta fundamentalmente a partir da quinta ou sexta década da vida”.
É que, apesar de se saber “pouquíssimo sobre a imunidade e o seu impacto na prevenção do cancro”, os médicos sabem que “ela tem uma importância muito grande e, com a idade, há mecanismos genéricos que não funcionam tão bem como numa pessoa de 20 anos”.
Ainda não há um rastreio generalizado, mas fumadores com mais de 50 anos devem estar atentos
Além da prevenção, o diagnóstico precoce é muito importante. Dois dos principais estudos feitos ao longo de seis e 10 anos, respetivamente nos Estados Unidos da América e na Europa, revelaram que o rastreio do cancro do pulmão reduz a mortalidade em mais de 20%. Hespanhol acrescenta mesmo que, “se formos capazes de identificar a doença antes que ela se dissemine pelo nosso corpo, conseguimos, muito provavelmente, curá-la”.
O importante é não esperar que apareçam sintomas, porque, nestes casos, “muito dificilmente conseguiremos ter o mesmo resultado do que se identificássemos esse tumor antes dos sintomas”.
Se formos capazes de identificar a doença antes que ela se dissemine pelo nosso corpo, conseguimos, muito provavelmente, curá-la
VENCESLAU HESPANHOL – DIRETOR DE PNEUMOLOGIA DO HOSPITAL DE SÃO JOÃO
Neste momento, ainda não existe na Europa uma política comum generalizada de rastreios de cancro do pulmão, uma vez que o despiste, por vezes, pode constituir algum risco para os pacientes, risco esse que não traz benefícios, caso o nódulo não seja cancro.
Mas Venceslau Hespanhol refere que os privados e algumas associações portuguesas já os fazem, indicando ainda que as pessoas que deveriam fazê-los são os fumadores “a partir dos 50-55 anos”.
E para tratar o cancro do pulmão?
Além da prevenção, a ciência tem dado grandes passos relativamente às terapias para tratar o cancro. Venceslau Hespanhol destacou, sobretudo, a chamada medicina de precisão e a imunoterapia, especialmente para “os doentes com doença avançada, já com lesões à distância, nos ossos ou no fígado, por exemplo”.
Ambas as terapias apresentam-se como uma opção à quimioterapia, que acaba por ser uma espécie de pesca de arrastão ao cancro, que mata tanto células saudáveis como cancerígenas. A medicina de precisão, por outro lado, ataca alvos específicos, as chamadas alterações moleculares, em determinados genes, e a imunoterapia dá “super-poderes” ao sistema imunitário que lhe permitem combater melhor o cancro.
Venceslau Hespanhol exemplificou diversos tipos de medicamentos de precisão que já existem contra o cancro do pulmão, bem como técnicas de imunoterapia. Para descobrir mais sobre o cancro do pulmão, assista à conversa completa no vídeo ou oiça o podcast abaixo.
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