Ao fim de cinco meses dedicado ao tratamento de doentes críticos infetados com a Covid-19, o anestesiologista e intensivista António Pais Martins, 57 anos, fez um balanço da sua experiência nos Cuidados Intensivos do Hospital de São Francisco Xavier, em Lisboa, e também do que já se sabe sobre a doença.
“O tratamento destes doentes, particularmente daqueles que se encontram em situação crítica, é desafiante porque não há um tratamento robusto para esta doença”, afirmou, perentório durante a conversa em direto com a VISÃO Saúde.
António Pais Martins alertou para a forte possibilidade de surgir uma segunda vaga da pandemia, destacando a relevância do investimento nos recursos humanos para a combater. “Não basta reforçar a rede de cuidados intensivos, uma cama não implica apenas um ventilador, implica toda uma equipa porque são doentes difíceis de tratar”, defende o intensivista.
Também os assintomáticos foram tema de conversa e o médico avançou com um número: “Só conseguimos diagnosticar 15% dos casos, daí a importância de testar, testar, testar.”
O coordenador da Unidade de Cuidados Intensivos I e II do Hospital São Francisco Xavier, em Lisboa, deixou críticas ao “abruto desconfinamento” que se seguiu ao período de maior contenção.
António Pais Martins considera essencial a redução das listas de espera que se avolumaram devido à suspensão da atividade não urgente nos hospitais durante o período mais crítico da pandemia.
O médico sublinhou, ainda, o impacto emocional da doença: “O ser humano tem medo do desconhecido e os profissionais de saúde também são seres humanos.” Porém, à medida que o conhecimento sobre a doença se foi acumulando, o medo dissipou-se. “Quando os doentes começaram a sair pelo seu próprio pé, sobreveio um sentimento de dever cumprido”, explicou.
A experiência adquirida ao longo dos últimos meses estará a contribuir para a diminuição da mortalidade provocada pelo SARS-CoV-2.
A experiência adquirida ao longo dos últimos meses estará a contribuir para a diminuição da mortalidade provocada pelo SARS-CoV-2. “Estamos a tratar melhor dos doentes porque conhecemos melhor a doença”, nota.
Por outro lado, o médico ressalva que tem a sensação – “e sensação não é um termo científico” – de que o perfil dos doentes se alterou. Agora, são mais jovens e têm menos doenças associadas, o que melhora o seu prognóstico.
Ainda assim, deixou conselhos a esta faixa etária: “Protejam-se. Não o façam por vocês, mas pelos mais velhos.”
O médico está otimista e acredita que “o interesse económico vai aguçar a produção de uma vacina”, que poderá estar disponível no início do próximo ano.
António Pais Martins considera que “o medo é mau conselheiro” e, por isso, acredita que ele deve ser substituído por “respeito pela doença”.
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