Ana Vieira é nutricionista clínica e, ao longo dos mais de 20 anos de carreira, viu muitas crianças ingerirem, por um lado, quantidades de alimentos desajustadas à sua idade e, por outro, a ingestão excessiva de alimentos nutricionalmente pobres. Nas consultas que dá, percebe que muitos pais não têm as bases de uma alimentação saudável, mas também têm dificuldade em encontrar essa informação. Por isso, decidiu escrever um guia com erros comuns, para que os pais possam fornecer aos mais novos uma alimentação mais saudável.
“Trabalhei neste livro desde 2019, foi um processo longo e, muitas vezes, revisto. Já tinha ideia de criar um manual que pudesse funcionar como um guia para dar continuidade às consultas que dou”, conta, à VISÃO. “Sou nutricionista no Serviço de Pediatria do Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho e achava que aquele tempo era curto para transmitir todas as informações aos pais. Sentia que precisavam de um manual de consulta fácil para que, em casa e com calma, pudessem ler. E até para as crianças, visto que é um livro acessível”, continua.
A autora explica que são poucos a trabalhar nesta área em pediatria. “E, por isso, acho que deve haver a necessidade de deixar as nossas experiências registadas e escritas, o nosso legado, que é o que fica”, afirma. O livro “25 Erros Alimentares nas Crianças: Como evitá-los?” é o reflexo dos anos de experiência da médica. “A grande diferença entre alimentação dos pais e das crianças é que elas precisam de orientação: enquanto o adulto é autónomo e tem a sua força de vontade, a criança precisa de autorização e de orientação, e toda a família tem de saber orientá-la”, analisa.
Mestre em Nutrição Clínica pela Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, a especialista afirma que a “literacia dos portugueses sobre a saúde é baixa” e que, além disso, não existe tempo. “Não temos trabalhos que nos permitam chegar a casa e preparar o jantar. É muito mais fácil chegar a casa às oito da noite e fazer uns nuggets para que seja rápido e para que as crianças vão para a cama o mais cedo possível”, identifica Ana Vieira.
Um exemplo dessa falta de literacia é considerar que uma criança magra é, por si só, uma criança saudável. “Vemos crianças pequenas com cáries ou com diabetes elevados ou colesterol, e quando se chama à atenção aos pais para essa realidade, eles dizem logo ‘mas ela é magra’, não tendo a noção que uma criança magra pode ingerir alimentos que são inadequados. Há muitas crianças que, tendo o peso saudável, não estão saudáveis”.
No livro são apresentadas várias soluções, por exemplo, de pequenos-almoços ou lanches saudáveis que os pais podem preparar para as crianças. “Ao fim-de-semana, os pais podem planear e, no livro, ajudo a que não se recorra tanto a produtos processados”, afirma. “Quando preparamos as coisas, conseguimos reduzir o desperdício e até poupar”. Mas é também fundamental que se saiba quais os produtos a comprar. “Por exemplo, eu explico como se lê um rótulo, que é uma grande dificuldade que os pais têm”.
A verdade é que as crianças nem sempre estão com os pais e, por isso, é importante que todos aprendam como a criança pode ter uma alimentação melhor, defende ainda a especialista. “É um processo que depende do apoio familiar, e muitas vezes quem vem as consultas são as mães. Era importante o pai e o resto da família terem acesso às informações dadas”.