O que são?
A talalgia, termo genérico para a dor no calcanhar, é uma das principais queixas que levam os doentes a recorrer à consulta de ortopedia.
É um sintoma que pode ser manifestado por patologias diferentes, pelo que existem diferentes formas de tratamento.
A maior parte são dores inflamatórias, de sobrecarga, por alteração da biomecânica do pé e tornozelo, mas também podem ser de causa neurológica, traumática, infecciosa ou tumoral.
É importante procurar uma avaliação médica especializada para o correto diagnóstico e tratamento da causa que origina a dor no calcanhar.
Quais as causas?
Os diagnósticos mais frequentemente associados à dor no calcanhar são:
• A fasceíte plantar e o esporão do calcâneo. Trata-se do processo de degeneração da fáscia plantar, que é uma estrutura cuja principal função é manter o arco plantar do pé durante o apoio e a marcha. O sintoma característico é a dor tipo picada debaixo do calcanhar, principalmente nos primeiros passos ao levantar da cama ou depois de estar sentado durante algum tempo. A dor tem tendência para melhorar progressivamente ao longo do dia com a marcha e agrava ao fim do dia, quando o doente permanece períodos muito longos de pé (ortostatismo).
• A tendinite do tendão de Aquiles, também uma patologia muito comum, principalmente em praticantes de atletismo e desporto de salto como o voleibol e o basquetebol, é caracterizada por uma dor na parte posterior do calcanhar. O tendão encontra-se doloroso ao toque e pode estar até mais globoso. Por norma, a dor alivia com repouso e com a diminuição da atividade.
• A bursite retrocalcaneana é a designação da inflamação da “almofada” (bursa) que existe entre o tendão e o calcâneo. Manifesta-se por dor na parte posterior do calcanhar, inchaço local, calor e, por vezes, rubor associado. O uso de calçado inadequado (com contraforte mais duro e afunilado, sendo comum no calçado de salto alto) e a deformidade de Haglund são as principais causas da formação das bursites do calcâneo.
• A deformidade de Haglund corresponde a uma saliência óssea na parte posterior superior do calcanhar. Desta forma, o calcanhar encontra-se alargado, o que aumenta o conflito com o calçado. Os doentes apresentam dor, edema (inchaço) e calor ao nível da inserção do tendão de Aquiles, e a bursite retrocalcaneana encontra-se presente na maioria dos casos sintomáticos.
• A síndrome do túnel társico é o termo que designa a compressão do nervo tibial ao nível do seu trajeto na face interna do tornozelo, no túnel társico. Neste caso, a dor é mais tipo queimadura e parestesias (formigueiro) pelo lado de dentro e planta do pé.
• O pé valgo e o pé varo também podem ser responsáveis pela dor no calcanhar, uma vez que correspondem a um desvio do eixo da carga e, desta maneira, sobrecarregam a parte interna (valgo) ou externa (varo) do pé.
• A barra társica é uma doença congénita que consiste na ausência da separação completa entre dois ou mais ossos do tarso. Apesar de não apresentar sintomas em 75% dos casos, quando se manifesta, os doentes apresentam dor abaixo do tornozelo, que se agrava com a atividade desportiva, pé plano rígido e história de entorses de repetição do tornozelo.
• A doença de Sever é uma das “doenças de crescimento” e caracteriza-se pela inflamação da zona de crescimento do calcâneo. Esta zona de osso imaturo, além de ter grande impacto no solo, está sujeita a forças de tração opostas provocadas pelo tendão de Aquiles e a fáscia plantar. É a causa mais frequente de dor no calcanhar nas crianças e adolescentes, sendo de início insidiosa, agrava-se com as atividades desportivas, sendo típica a necessidade de tirar a sapatilha para massajar o calcanhar. É uma doença com resolução espontânea e que não deixa sequelas após a maturação do esqueleto.
Como se tratam?
No que concerne ao tratamento das patologias responsáveis pela dor no calcanhar, de uma forma geral, a sua abordagem inicial deve passar por:
• Repouso
• Gelo local na fase aguda
• Medicação (anti-inflamatórios e analgésicos)
• Modificação da atividade (diminuição da frequência/duração/carga de atividades que estejam na causa do agravamento da dor)
• Perda de peso (quando aplicável)
• Plano de exercícios de alongamento muscular
• Tratamento fisiátrico
• Ortóteses plantares/palmilhas personalizadas
Quando o diagnóstico e a instituição do tratamento são atempados, esta abordagem, o chamado tratamento conservador, tem uma taxa de sucesso bem acima dos 90 por cento.
Todavia, se os sintomas persistirem mesmo após o tratamento conservador, o doente deve ser novamente reavaliado, ponderando-se o tratamento cirúrgico.
Este último deve ser dirigido à causa da dor e é muito importante que seja individualizado, pois existem várias técnicas cirúrgicas para o tratamento da mesma patologia e a dor pode ser causada por mais do que uma patologia em simultâneo.
Atualmente, a maioria das técnicas cirúrgicas utilizadas no tratamento destas patologias são minimamente invasivas, muitas delas recorrendo à endoscopia. São cirurgias realizadas em regime de ambulatório, em que o doente vai para o seu domicílio no próprio dia, sendo que a maioria permite iniciar marcha com carga no pé operado. São cirurgias que apresentam elevadas taxas de sucesso, permitindo um célere regresso às atividades do dia a dia.
5 medidas de prevenção
Há alguns cuidados diários que devemos adotar e que são fundamentais para a saúde e bem-estar dos nossos pés.
- Escolha do calçado
Nunca adaptar o pé ao calçado. Esta é a principal regra da escolha do calçado.
O calçado adequado é aquele que se adapta ao pé e à sua função. Além de o proteger, deve ser confortável e amortecer o impacto.
Evitar calçado apertado, de sola dura ou com sola demasiado gasta.
Apenas uma chamada de atenção para o calçado de salto alto: o seu uso excessivo leva ao encurtamento da musculatura posterior da perna e do tendão de Aquiles, podendo causar dor ao nível do calcanhar.
- Exercitar os pés
O exercício, além dos benefícios sistémicos para o organismo (efeito protetor de eventos cardiovasculares, diabetes, etc.), permite fortalecer e preparar o pé para as agressões do dia a dia. Deve ser planeado e adaptado à pessoa (por exemplo, atividade desportiva na água em pessoas com excesso de peso permitirá diminuir a sobrecarga nos pés).
Um plano de alongamento miotendinoso deve ser sempre englobado.
- Descanso
Além do exercício, ter tempo para descansar também é fundamental para a saúde do pé. A drenagem postural permite uma recuperação muscular e articular, assim como diminuição de edema e dor.
- Manter a forma física
Combater o excesso de peso permite diminuir a sobrecarga nos pés e, para isto, não só o exercício é fundamental como também os cuidados alimentares são de extrema importância.
- Uso de palmilha
A palmilha pode ser uma boa arma para controlo e prevenção da dor. Através de uma análise biomecânica, é pensada e construída uma palmilha individualizada, que ajuda na correção do alinhamento do pé, na redistribuição da pressão plantar e no amortecimento dos impactos do pé no solo.
“Na sua maior parte, são dores inflamatórias, mas também podem ter uma causa neurológica, traumática, infecciosa ou tumoral”