Há muitos sintomas que são iguais aos de outras doenças. Por isso, os médicos dizem que tem de se estar atento se eles durarem mais do que o normal
É preciso explicar, em primeiro lugar, que “não existem sintomas ou sinais específicos para a doença oncológica”, nota Li Bei, oncologista no Hospital CUF Descobertas. Há sinais de alerta que podem ter como consequência outras doenças, mas também podem ser cancro, por isso é necessário investigar. A “tosse e rouquidão”, exemplifica Sérgio Barroso, oncologista e diretor clínico da Clínica de Santo António, podem ter “muitas causas”, como o frio que se apanhou em determinado dia. No entanto, se a tosse não passar em três ou quatro dias é porque a causa pode ser outra, e uma delas pode ser doença cancerígena. A persistência dos sintomas é um sinal de alerta. O mesmo se pode dizer do cansaço, que pode ter origem “numa panóplia de situações clínicas”, como refere o oncologista Hélder Mansinho. O importante, resumem os especialistas, é ter atenção ao corpo e às alterações que possam surgir, até porque o cancro, muitas vezes, não manifesta quaisquer sinais até que esteja num estádio avançado de evolução. “O cansaço, o emagrecimento e a falta de apetite podem acompanhar outras queixas e, habitualmente, estão associados a formas de doença mais avançada”, conclui a médica Li Bei. Estes são os nove sinais mais comuns que, quando aparecem sem explicação e de forma persistente, necessitam de uma ida ao médico e da realização de exames.
1. Alteração dos hábitos intestinais ou urinários
A alteração brusca dos hábitos intestinais pode ser motivo de preocupação. “É claro que podem surgir variações nos intestinos. Por exemplo, se alguém come qualquer coisa estragada pode ter diarreia, mas passa ao fim de três dias. Quando é persistente é que é necessário averiguar”, explica o oncologista Sérgio Barroso. Se costuma “defecar” uma vez por dia e, de repente, passa a “três vezes por dia” de forma continuada é sinal de que algo pode não estar bem. O mesmo, caso aconteça “uma obstipação”, avança Hélder Mansinho, diretor do Serviço de Hemato-Oncologia do Hospital Garcia de Orta. Estes podem ser alguns sintomas de cancro colorretal, embora “nenhum seja específico de cancro”, observa Hélder Mansinho. Já o urinar frequente ou com dor, sintomas que também são comuns nas infeções urinárias, podem ser sinais de cancro na bexiga ou na próstata. O que quer dizer que é necessário “investigar as causas” da diarreia, da obstipação ou do urinar frequente ou com dor.
O que é o estádio do cancro?
A gravidade do cancro tem uma classificação médica que vai de I a IV, sendo esta última a mais grave
O estado ou, como se diz tecnicamente, estádio, do cancro é um sistema de classificação científica das neoplasias que está relacionado com a extensão do tumor e a sua disseminação pelo organismo.
Podemos dizer que é uma forma de organizar as informações recolhidas através de exames e biópsia para que os médicos avaliem qual a terapêutica a seguir – se operação ou tratamento ou ambas – e o prognóstico (previsão do risco de evolução).
Os estádios vão de I a IV. O estádio I é o mais inicial e o estádio IV o mais avançado. Os II e III são estádios intermédios. Quanto mais inicial for, maior é a probabilidade de cura”, explica Sérgio Barroso, oncologista e diretor clínico da Clínica de Santo António.
O estádio I, normalmente, “corresponde a doença de pequenas dimensões que se mantém limitada ao órgão original”, explica Ricardo Luz, oncologista do Hospital Lusíadas Lisboa. No estádio II, o cancro também se mantém limitado ao órgão que lhe deu origem, mas “a doença é de maiores dimensões”, acrescenta. Por seu lado, no estádio III, o cancro é mais extenso e atingiu “os gânglios linfáticos loco-regionais” (gânglios que circundam o órgão em que a doença se originou). Já no IV e último estádio, o mais grave, a doença “disseminou-se para além dos gânglios locais e regionais”, continua, havendo aquilo a que se chama de lesões à distância, conhecidas como metástases.
2. Atenção aos sinais na pele
Os sinais que temos no corpo devem ser simétricos. Quando há “uma modificação da cor”, da “dimensão” ou “ulceração”, salienta Sérgio Barroso, oncologista e diretor clínico da Clínica de Santo António, do sinal ou de uma verruga é bom consultar um especialista. “Se um sinal muda visivelmente de características”, acrescenta Li Bei, oncologista no Hospital CUF Descobertas pode ser um sintoma de neoplasia. Ter “prurido” (comichão) num sinal, desde que não seja ocasional, ou “se existe uma pequena ferida”, deve ser foco de atenção.
3. Rouquidão ou tosse persistente
“A falta de ar, a tosse e a dor torácica não são exclusivas do cancro do pulmão e, com frequência, são desvalorizadas”, nota a oncologista Li Bei. Aliás, muitas vezes, estes sintomas são “confundidos” com a doença pulmonar obstrutiva crónica, vulgarmente conhecida pelas iniciais DPOC. A tosse “pode ter muitas causas”, diz o especialista Sérgio Barroso, e as pessoas tendem a menosprezar e a pensar que vai passar, mas é “preciso investigar qual das causas é, porque uma delas pode ser cancro”. Uma tosse seca e persistente pode ser indicativa de cancro. Quer seja do pulmão, laringe ou faringe. Os fumadores devem estar muito atentos, já que são a grande maioria dos doentes com cancro no pulmão.
4. Má digestão
A dificuldade em engolir ou a “má digestão permanente”, indica o oncologista Hélder Mansinho, são sintomas que poderão levar a um diagnóstico de tumor no estômago ou no pâncreas. Não falamos, claro, da sensação de enfartamento que muitas vezes experimentamos depois de uma refeição, mas sim de uma situação repetitiva, também conciliada com “dores abdominais permanentes”, acrescenta. A disfagia (dificuldade em engolir), que é um sinal de mau funcionamento do esófago, é uma situação pouco frequente, aliás acontece mais nos idosos. No entanto, se for persistente, pode ter por detrás uma doença grave.
A dificuldade em engolir ou a má digestão permanente são sintomas que poderão levar a um diagnóstico de tumor no estômago ou pâncreas
Hélder Mansinho
Diretor do Serviço de Hemato-Oncologia do Hospital Garcia de Orta, em Almada
5. Feridas sempre abertas
O aparecimento de feridas em qualquer parte do corpo, como na boca ou na pele, que teimam em não cicatrizar podem indicar um cancro em fase inicial. “O normal é termos uma ferida e pouco depois passa, cicatriza. Caso se mantenha aberta durante semanas, é melhor consultar um especialista”, alerta o oncologista Sérgio Barroso. Não esquecer que a dificuldade em cicatrizar acontece muito nos diabéticos, indicando um descontrolo na diabetes. Caso uma ferida não cicatrize em quatro a seis semanas, deve ser investigada para se excluir uma lesão maligna.
6. Hemorragias
A “hemorragia ou corrimento anormal pelos orifícios naturais (nariz, boca, ouvidos, ânus, vagina, uretra)”, explica o especialista Sérgio Barroso, são indícios de que se passa algo de anormal. O “sangue nas fezes”, nota a médica Li Bei, pode estar relacionado com o cancro colorretal. Já um sangramento “excessivo durante a menstruação”, avança o oncologista Hélder Mansinho, ou “fora da menstruação”, assim como um corrimento escuro, são sinais de que podemos estar perante um cancro no útero. Outros tipos de sangramentos, como o caso da expetoração com sangue, são um dos sintomas de cancro no pulmão, assim como o sangue na urina ou no sémen pode ser um problema na próstata.
Hemorragia anormal pelos orifícios naturais (nariz, boca, ouvidos, ânus, vagina, uretra) são indícios de que se passa algo de anormal
Sérgio Barroso
Oncologista e diretor clínico da Clínica de Santo António
7. Nódulos ou rigidez persistente
“Todos devemos estar atentos ao nosso corpo e às alterações que possam surgir”, atesta a oncologista da CUF Descobertas, Li Bei. O aparecimento de “nódulos ou massas em qualquer parte do corpo”, continua, deve ser analisado. Assim, como a “rigidez persistente na mama ou noutra zona”, acrescenta Ricardo Luz, oncologista no Hospital Lusíadas Lisboa.
O “normal é não ter nódulos”, diz o médico Sérgio Barroso, se a “mulher apalpa a mama e sente um nódulo, uma massa a mais” deve procurar um especialista.
8. Cansaço continuado
Claro que se fizer exercício é normal que fique cansado, mas não é desse tipo de cansaço que estamos a falar. Um dos motivos do cansaço pode ser uma anemia, mas “este é um sinal muito genérico”, nota Hélder Mansinho. A anemia pode ter várias causas, sendo verdade que uma delas pode ser o desenvolvimento de um cancro. Fazer pequenas coisas, como subir escadas, e ficar cansado é indicativo de que o sangue não está a ser devidamente oxigenado devido à perda de glóbulos vermelhos causados pela anemia. O cansaço fácil pode ser fator de risco para o cancro do pulmão, assim como a fadiga está relacionada com o cancro colorretal e do útero devido à anemia causada pelas perdas de sangue.
9. Perder peso rapidamente
O emagrecimento rápido, “mais de 10% do peso corporal em três meses”, constata o oncologista Hélder Mansinho, sem estar a fazer dieta ou exercício para baixar a balança, pode indicar uma “neoplasia”. Mas também pode ser “uma diabetes ou hipertiroidismo”, acrescenta. Pelo que, mais uma vez, só os exames de diagnóstico poderão comprovar a origem. De qualquer das formas, é um sintoma frequente nas pessoas que desenvolvem cancro, nomeadamente do esófago, estômago, pâncreas e pulmão.
Que tipos de cancro existem?
Há diversos tipos de cancro, dependentes do órgão e tecido em que têm origem. A Sociedade Portuguesa de Oncologia ajuda-nos a conhecê-los
Carcinoma
Tem origem nos tecidos de revestimento dos órgãos (os epitélios). O epitélio mais notório é a pele, mas há outros, como a camada de revestimento do tubo digestivo, ou dos aparelhos respiratório e genital.
Sarcoma
Tem origem no tecido mesenquimatoso, como, por exemplo, ossos, cartilagens os músculos ou tendões.
Melanoma
Tem origem na pele. Em geral, desenvolve-se a partir de um sinal que muda de tamanho, formato ou cor.
Mieloma, linfoma e leucemia
Têm origem nas células do sangue. São denominadas doenças hemato-oncológicas.
Os exames para o diagnóstico
O oncologista Ricardo Luz, do Hospital Lusíadas Lisboa, diz-nos quais são os exames mais comuns para detetar os cancros mais frequentes no nosso país
Análises clínicas, raio-x, ressonância magnética (RM), tomografia axial computorizada (TAC) e biópsia são os exames mais comuns para se detetar um tumor. No entanto, cada tipo de cancro tem exames específicos que ajudam a fazer o diagnóstico. “É da ponderação dos diversos exames – análises laboratoriais, ecografia, TAC, RM, PET [para o cancro do pulmão] ou outros que se poderá tirar as melhores conclusões”, explica o médico.
Sendo a biópsia o culminar da “confirmação da doença” e a sua extensão, há outros exames que se fazem antes. Assim, nas afeções mamárias, utiliza-se a “mamografia, a ecografia mamária e a ressonância magnética”, na pesquisa de doença colorretal, utiliza-se a “colonoscopia e, frequentemente, a TAC” e, para o cancro do estômago, a “endoscopia”. No caso do cancro do pulmão, e dependendo do local da doença, poderá ser realizada “broncofibroscopia ou punção transtorácica guiada por TAC”. A TAC, nota o médico, é fundamental para se avaliar a extensão da doença no pulmão, “podendo ser complementada”, conforme os casos, por outros exames como a “tomografia de emissão de positrões (PET, na sigla anglo-saxónica)”.
Na suspeita de cancro da próstata, realiza-se uma biópsia prostética, “guiada por ecografia ou ressonância magnética na zona”.