Com mais de dois milhões e meio (2 541 950) de portugueses vacinados contra a gripe sazonal, este inverno aparenta ser de nova calmaria no que à gripe diz respeito. Na segunda semana do ano (de 10 a 16 de janeiro), segundo o Boletim de Vigilância Epidemiológica da Gripe e outros Vírus Respiratórios do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), a taxa de incidência de síndrome gripal foi de 33,5 por cada 100 mil habitantes e a taxa de infeção respiratória aguda de 62,1 por cada 100 mil habitantes. Duas gotas no oceano de Covid-19, com a incidência nacional de infeções por SARS-CoV-2 a chegar esta segunda-feira, 24, aos 5 322,6 casos por cada 100 mil habitantes.
Já no ano passado, e com o País a braços com a onda de infeções que levou a um pico de Covid-19 e à consequente rutura dos serviços hospitalares (internamentos e unidades de cuidados intensivos), a taxa de incidência da gripe situava-se em 34,05 por 100 mil habitantes. E, recuando à mesma semana, em 2020, quando a pandemia ainda estava lá longe na China, a taxa de incidência da gripe subia para 44,64 por 100 mil habitantes.
Na semana dois deste ano, não foram detetados casos de gripe na Rede Médicos-Sentinela, com 20 927 pessoas sob observação, nem pelas 19 Unidades de Cuidados Intensivos e três enfermarias que enviam informação. Só a Rede Portuguesa de Laboratórios para o Diagnóstico da Gripe (hospitais) detetou 12 casos positivos para o vírus da gripe (11 do tipo A e 1 do tipo B). E, quanto à “flurona”, a co-infeção pelo vírus da gripe e SARS-CoV-2, foram detetados seis casos.
Em muito contribuiu, seguramente, as temperaturas superiores ao normal: de acordo com o Instituto Português do Mar e da Atmosfera, em Portugal continental, em dezembro de 2021, o valor médio da temperatura mínima do ar (7,66 °C) foi 1,62 ºC superior ao normal (1971-2000) e na segunda semana de janeiro de 2022, o valor médio da temperatura mínima do ar (4,65°C) foi 0,11°C superior ao valor normal para o mês de janeiro. Com o frio dos últimos dias, os próximos números de casos de gripe poderão vir a aumentar.
Recorde-se que em 2020 e 2021 registaram-se temperaturas muito mais baixas. No ano em que a pandemia começou, em janeiro de 2020, o valor médio da temperatura mínima do ar (2,26 °C) foi 2,28 °C inferior ao valor normal para o mês de janeiro. E, em janeiro de 2021, o valor médio da temperatura mínima do ar (-0,65 °C) foi 5,15 °C inferior ao valor normal para o mês de janeiro, tendo sido a quarta semana consecutiva com anomalia negativa.
Analisando a situação internacional, no início deste ano, seis países (Arménia, Bielorrússia, Sérvia, França, Geórgia e Estónia) apresentavam uma taxa de deteção laboratorial do vírus da gripe acima de 10 por cento. Dos 2 576 indivíduos testados, 5% foram positivos para o vírus da gripe, o que representa um decréscimo de 10% relativamente à última semana de 2021.
Entre a comunidade científica internacional, os especialistas têm alertado que a gripe voltou à Europa a um ritmo mais rápido do que o esperado neste inverno, depois de quase desaparecer no ano passado. Os confinamentos, o uso da máscara, o distanciamento físico e a lavagem das mãos, regras que se tornaram normas em toda a Europa, eliminaram a gripe no inverno passado, erradicando temporariamente um vírus que mata cerca de 650 mil pessoas em todo o mundo por ano, segundo dados da União Europeia.
Segundo informações do Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC), em dezembro de 2021, o número de casos de gripe nas Unidades de Cuidados Intensivos (UCI) europeias aumentou de forma constante, atingindo o pico de 43 na última semana do ano. No entanto, muito abaixo dos níveis pré-pandémicos, em que os casos semanais de gripe em UCI chegou a mais de 400 no mesmo período de 2018, por exemplo.
O regresso do vírus pode ser o início de uma temporada de gripe invulgarmente longa que se pode estender até o verão, muito além do final normal da temporada europeia em maio, disse à Reuters o principal especialista em influenza do ECDC, Pasi Penttinen. “Se começarmos a suspender todas as medidas, a grande preocupação que tenho com a gripe é que, por termos tido tanto tempo de quase nenhuma circulação na população europeia, talvez nos afastemos dos padrões sazonais normais”, explica.
Este ano, a variante de gripe dominante a circular, tudo indica ser a H3 do vírus tipo A, que geralmente é responsável pelos casos mais graves entre os idosos. Para Pasi Penttinen ainda é cedo para fazer uma avaliação final da eficácia das vacinas contra a gripe, pois é necessário um número maior de pessoas doentes para análises mais apuradas. Mas, testes de laboratório têm mostrado que as vacinas disponíveis, este ano, “não serão ótimas” contra a variante H3. Desenvolver a composição das vacinas seis meses antes do início da temporada de gripe, com base na circulação de vírus no hemisfério oposto, quando existe pouco ou nenhum vírus a circular, dificulta e muito o trabalho das farmacêuticas.