A infeção foi detetada numa mulher que tinha procurado tratamento num centro de saúde, em Butembo, na província do Kivu Norte, porque apresentava sintomas condizentes aos provocados por aquele vírus assassino, conhecido por ter dizimado boa parte da população do leste da República Democrática (RD) do Congo nos últimos anos. O segundo maior surto mundial de Ébola ali durou quase dois anos e provocou quase 2 300 mortos, entre qualquer coisa como 3 500 casos.
No final de 2020, o surto foi oficialmente considerado extinto pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e o mundo comemorou. Agora, perante este caso, anunciado pelas autoridades de saúde do país, aquela organização apressou-se a identificar as mais de 70 pessoas que terão estado em contato com a mulher e decretou a desinfeção dos lugares por ela visitados. “Não é raro que casos esporádicos ocorram após um surto importante”, assinalou a OMS, assumindo, no entanto, que até se garantir que não surge novo surto, todos os cuidados são poucos.
Outro vírus que saltou a barreira das espécies
A mutação viral que levou ao surto naquele país africano entre 2014 e 2016 revelou-se a mais letal da família do vírus, cujos primeiros surtos conhecidos, tanto na RD Congo como no Sudão, a meados de 1970.
Trata-se de um vírus transmitido por contato direto com fluidos ou secreções corporais (como sangue, urina, fezes, saliva ou sémen) de pessoas infetadas, estejam vivas ou mortas. Pode ainda contagiar através do contacto direto com superfícies, objetos ou roupas contaminadas com fluidos de doentes. Sabe-se ainda que a doença pode também ser transmitida por contacto sexual não protegido até três meses depois de alguém se ter recuperado da doença – tal como por contacto direto com sangue e outros fluidos corporais de animais portadores da doença ou pela ingestão da carne dos mesmos.
Quando ressurgiu em força, em 2014, a investigação científica revelaria que o surto inicial teve origem nuns morcegos, nos quais o vírus é endémico. A elevada taxa de contato entre a vida selvagem e os humanos é depois apontada como a razão para o vírus em causa ter saltado a barreira das espécies. Algumas das estirpes nem deixam as pessoas doentes, mas a maioria atinge taxas de letalidade entre os 50% e os 70 por cento, sublinha a OMS – antes de assinalar que depois há estas mais mortais, que chegam aos 90 por cento.
Muito mais mortal do que a Covid-19…
No início de 2020, a administração de uma vacina, acabada de ser aprovada pela OMS depois de demonstrar uma eficácia de 97,5 por cento nos testes preliminares, reduziu logo a quantidade de casos mortais. Só na RD Congo, onde o surto assumira maiores dimensões, mais de 290 mil pessoas foram logo vacinadas.
Até que, há cerca de três meses, a OMS decretou mesmo o fim da epidemia na região, dada como terminada após 42 dias desde que o último paciente testara negativo pela primeira vez – e sem que nenhum novo caso positivo tenha aparecido desde então, cumprindo-se o critério para declarar a conclusão de um surto deste tipo.
“Superar um dos agentes patógenos mais perigosos do mundo, em comunidades remotas e difíceis de alcançar, mostra o que é possível quando a ciência e a solidariedade se unem”, declarou, então, a diretora regional da OMS para a África, Matshidiso Moeti, depois de assinalar que “lidar com o Ébola em paralelo com a covid-19 não foi fácil, mas muito da experiência que ganhamos com uma doença pode ser transferida para outra”. O Ébola, recorde-se, tem uma taxa de mortalidade muito mais elevada do que a Covid-19, mas ao contrário do coronavírus, não é transmitido por portadores assintomáticos.