Os cidadãos espanhóis que recusarem a vacina da Covid-19 vão ficar registados numa base de dados, anunciou o ministro da Saúde, Salvador Illa. A informação poderá ser partilhada com os parceiros da União Europeia, mas não será tornada pública, esclareceu o governante do país vizinho, garantindo “o máximo respeito pela lei de proteção de dados”. Em entrevista ao canal televisivo La Sexta, Salvador Illa justificou a medida com a necessidade de assegurar que nenhuma pessoa será esquecida pelo sistema – lá, como cá, serão os serviços de saúde a chamar os utentes para receberem a vacina. Ao mesmo tempo, o ministro sublinhou a importância de se apurarem as razões da rejeição, tendo em vista a adoção de estratégias mais eficazes em campanhas de sensibilização para a inoculação contra a doença.
Estes argumentos não convencem toda a gente. A decisão do executivo liderado por Pedro Sánchez está a gerar indignação do outro lado da fronteira, desde logo expressa nos comentários no Twitter do programa televisivo no qual Salvador Illa a revelou. Alguns exemplos: “Listas negras do regime bolivariano”; “Onde está a democracia?”; “Duvido que estas listas sejam legais e constitucionais”; “Mais do que suspeito. Não há lista para a gripe, porque há com esta?”; “Se tu te vacinas, o que te importa o que outros façam se estarás protegido?”.
Como em Portugal, a vacinação contra a Covid-19 será voluntária em Espanha. De um modo geral, os governos estão apostados em usar a pedagogia e a persuasão para se atingir a ambicionada imunidade de grupo das populações. Deste lado da Península Ibérica, o Plano de Vacinação contra a Covid-19 prevê o “registo e monitorização” de todos os que forem vacinados – e apenas esses -, ficando o registo “acessível, quer aos utentes, quer aos profissionais de saúde”. O objetivo é conhecer as “taxas de cobertura da vacinação de toda a população portuguesa, bem como disponibilizar a informação aos médicos de família e às unidades funcionais de saúde sobre a evolução do estado vacinal dos utentes inscritos”, além de facilitar a “identificação de qualquer reação adversa”. Sobre os utentes que não pretendam ser vacinados, não existe qualquer referência no Plano, mas um registo semelhante ao que vai ser implementado em Espanha encontraria bases legais para ser adotado Portugal.
“Seria uma questão de se legislar nesse sentido”, explica João Traça, advogado especializado na área da proteção de dados, “ou através de despacho ministerial ou de uma lei aprovada na Assembleia da República”, neste caso para salvaguardar direitos, liberdades e garantias previstos na Constituição, nos quais uma decisão desta natureza poderia ser enquadrada.
A medida implicaria igualmente uma consulta à Comissão Nacional de Proteção de Dados, acrescenta o jurista da Miranda & Associados, tendo a proposta de incluir informações detalhadas como, por exemplo, qual a finalidade, quem pode ter acesso e quem é responsável pelo sistema informático – e, por conseguinte, de segurança. “O desenho deste tipo de leis tem de obedecer a princípios de privacidade, de modo a respeitar o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados”, sublinha João Traça, destacando a importância da solução informática estar em conformidade com as regras definidas, por forma a não dar azo a que pessoas não autorizadas acedam aos dados.
Portugal e Espanha, à imagem de outros países da União Europeia, iniciaram o processo de vacinação no passado domingo, 27, um ano depois de a China ter reportado à Organização Mundial de Saúde o primeiro caso de infeção pelo novo coronavírus.