Os doentes recuperados da covid-19 podem vir a sofrer problemas mentais, assim conclui um estudo preliminar realizado pela Universidade de Oxford, no Reino Unido. Em maio deste ano, em pleno estado estado de calamidade no País, a Organização Mundial de Saúde (OMS) tinha alertado para o impacto da covid-19 na saúde mental, com a possibilidade de haver um aumento de distúrbios e suicídios. A organização pediu, assim, para que o apoio psicológico não fosse negligenciado, já que o confinamento, a incerteza em relação ao futuro e a crise económica podiam provocar sérios problemas a nível mental.
Agora, esta investigação, publicada recentemente na revista científica The Lancet e que tinha como objetivo analisar a possível relação entre a Covid-19 e a saúde mental, sugere que esse tipo de distúbios, como ansiedade, depressão e insónia, podem surgir depois de haver infeção pelo coronavírus. Além disso, concluíram os investigadores, o risco de demência aumenta significativamente em doentes recuperados da Covid-19.
Os cientistas analisaram o historial clínico de mais de 69 milhões de norte-americanos, de 20 de janeiro a 1 de agosto, entre os quais mais de 62 mil ficaram infetados pelo coronavírus, comparando os dados destes últimos doentes com os de pessoas com outras doenças, como gripe, infeções respiratórias, infeções de pele, e problemas de ossos ou rins, por exemplo.
A partir dessa análise, a equipa deu conta de que, entre os 14 e os 90 dias seguintes ao primeiro teste positivo para a Covid-19, um quinto dos doentes tinham recebido um diagnóstico de depressão, ansiedade ou insónia. Este rácio, conclui o estudo, é duas vezes superior relativamente ao encontrado nos outros grupos de doentes, analisados no mesmo período de tempo (em termos de percentagem, o valor é de 5,8% dos recuperados com diagnóstico de transtorno mental, comparativamente aos 2,5% a 3,4% dos pacientes utilizados para comparação).
Além disso, os investigadores também perceberam que pessoas com doenças mentais pré existentes têm um risco 65% maior de virem a ser diagnosticadas com Covid-19, em relação às que não sofrem qualquer distúrbio psicológico.
O que pode explicar estes resultados?
A equipa diz que há doentes que têm medo de que a doença se agrave, mas também falam dos efeitos negativos do isolamento por longos períodos de tempo, que podem justificar o aumento de transtornos psicológicos nestes doentes. Ainda assim, não descartam a hipótese de estes problemas se tratarem de sintomas do vírus ou até de efeitos secundários dos medicamentos utilizados para o seu tratamento.
Mas é importante ter-se em conta que este estudo é ainda muito inicial, não oferecendo dados analisados a longo prazo. Além disso, não tem em conta os sintomas físicos pós-Covid que muitos doentes sofrem e que podem ser muito angustiantes.
À agência Reuters, Paul Harrison, professor de psiquiatria da Universidade de Oxford, explica que é urgente a necessidade de uma investigação mais profunda neste campo, no sentido de se conseguirem identificar novos tratamentos para doenças mentais pós-Covid.
“Sabemos, a partir de pandemias anteriores, que as os problemas relacionados com a saúde mental aparecem com frequência nos sobreviventes e este estudo mostra o mesmo padrão para o pós Covid-19, por isso não é inesperado”, explica à CNN Dame Til Wykes, do Instituto de Psiquiatria, Psicologia e Neurociência do King’s College London, Inglaterra, que realça, também, a importância do desenvolvimento de formas de apoiar estes pacientes no que diz respeito à sua saúde mental.