O que diz a ciência
Estimativas:
Cerca de 10% das mulheres de 8% dos homens experimentam um trauma ao longo da vida e tendem a superá-lo através da aprendizagem de competências e desenvolvem resiliência
Fatores de risco:
A propensão é maior em pessoas com antecedentes (carga de trauma ao longo da vida), sobretudo se houve perdas e condições adversas na infância, em função da gravidade e da intensidade da experiência
Experiências potencialmente traumáticas:
Tortura e agressão sexual; situações de combate e migração (refugiados de guerra); agressão física; procedimentos médicos invasivos (exemplos: intubação, cirurgias ao tórax e internamento prolongado em unidades de cuidados intensivos); catástrofes naturais; violência interpessoal; acidentes de viação. Surtos e pandemias constituem stressores, alguns bem elevados, como se tem verificado com o novo coronavírus, que desencadeou aumento de sintomas em médicos, pacientes e cidadãos em geral, pelo medo de infeção, contaminação, doença, isolamento social, sofrimento e morte ou perda de vidas e de condições de vida
Risco de exposição:
Uma situação traumática não gera doença, a exposição repetida à situação e a acumulação com outras condições de saúde ou de vida negativas sim. A maioria das pessoas expostas recupera num mês, em média, e não chega a desenvolver PTSD
Sintomas:
Durante pelo menos um mês ou mais, apresentar memórias recorrentes e pensamentos intrusivos, flashbacks, problemas de sono, pesadelos, hipervigilância, irritabilidade, raiva, autodesvalorização (vergonha, culpa), sintomas dissociativos (sensação de despersonalização, de sentir que não é real o que está a viver)
Os danos na saúde: alterações estruturais no sistema nervoso (sobrecarga do sistema simpático, responsável pela agressão e a fuga e prejuízo do parassimpático, associado às funções vegetativas como a digestão, o relaxamento e o sono); enviesamento da perceção (foco excessivamente centrado no perigo); défice cognitivo (capacidade de foco, tomada de decisão) e emocional (desregulação das ações e afetos); perda do prazer de viver (disfunção no circuito cerebral que envolve a recompensa e a libertação de dopamina) e dor psíquica
Do oito ao oitenta: progressão em cinco passos
Resposta de stresse normal – em face de um susto ou uma contrariedade que, vistos como ameaças, o cérebro primitivo dispara e são libertadas na corrente sanguínea hormonas que preparam o corpo para lidar com o perigo e a tensão e se manifestam em alterações fisiológicas que normalizam no espaço de horas, dias ou duas semanas
Perturbação de stresse agudo – tende a acontecer em fases de transição de vida. O cérebro processa a situação como perigosa e capaz de por a sua vida em risco. É o caso dos desastres naturais, da perda de familiares, do emprego, da casa, etc, mas pode ser uma situação imaginada e ter o mesmo impacto
PSPT não complexa – havendo várias situações potencialmente traumáticas, a resposta está ligada à situação principal e manifesta-se através do evitamento (de contactos sociais, relacionamentos, etc) e de de memórias e pensamentos recorrentes e perturbadores, que levam a pessoa a isolar-se
PSPT complexa – comum em casos de abuso, exposição repetida a violência ou perdas. Dado envolver condutas impulsivas, agressão e abuso de substâncias, além de raiva intensa, depressão ou pânico, pode confundir-se com outros tipos de perturbação (“borderline”, anti-social ou dissociativa, por exemplo)
PSPT comórbida – quando há mais de um problema de saúde mental associado a abuso de substâncias. Aqui é frequente querer tratar do problema sozinho, com automedicação, por exemplo, a fim de anestesiar a dor, em vez do acompanhamento profissional com um plano terapêutico
O que pode ser feito
Suporte social
A ajuda familiar, o apoio de amigos e da comunidade são fundamentais na recuperação de uma experiência marcante que causou danos físicos e/ou psicológicos e até existenciais
Medicação
Seja pelo médico de família ou de outra especialidade (psiquiatria, neurologia, etc), é útil a prescrição de medicamentos para estados ansiosos, quadros depressivos e de dor
Psicoterapia
O acompanhamento com um psicólogo, complementada ou não por fármacos, é eficaz no alívio dos sintomas e no ensaio das mudanças a adotar em fases específicas da vida
EMDR
Técnica de dessensibilização e reprocessamento de traumas pela estimulação bilateral (ocular, auditiva ou tátil), manual ou com recurso a software, feita por psicólogo certificado
MDMA
Estudos recentes têm vindo a validar o uso medicinal de drogas psicadélicas para reprocessar experiências traumáticas, acompanhadas por clínico certificado
Fontes: DSM-V; APA; University of Michigan Medical School;