O nome é estranho, mas o processo é simples. A angioplastia coronária é um método que se realiza a seguir a um evento de enfarte agudo do miocárdio ou em doentes que têm angina de peito – uma dor torácica provocada pela má irrigação do coração – , mas também em pessoas que, mesmo não tendo qualquer dor, apresentam isquémia ou uma lesão coronária grave.
“Consiste em desobstruir as artérias coronárias, que irrigam o miocárdio, através da inserção de um cateter pela artéria radial – punho-, ou femoral -virilha”, explica à VISÃO Duarte Cacela, cardiologista no Centro do Coração da CUF Lisboa. Através desse cateter, conduz-se um pequeno fio que atravessa a zona obstruída e por onde vão passar balões e pequenas redes metálicas que vão desentupir a artéria e devolvê-la ao seu calibre e fluxo originais.
Quando se trata de casos de enfarte agudo do miocárdio, o tempo é crucial, diz o médico, e, por isso, deve ser realizada uma angioplastia primária o mais rapidamente possível, idealmente até 90 minutos após o início dos sintomas. Desta forma, a possibilidade de reverter as sequelas é muito maior. “Quanto maior for o lapso de tempo entre o início dos sintomas e a desobstrução da artéria coronária, maior é a quantidade de células cardíacas que morrem, e portanto maior é o dano cardíaco irreversível sofrido pelo paciente”, esclarece o médico. Isto porque as células musculares cardíacas não se multiplicam, o que significa que a morte de umas não é compensada pelo nascimento de outras.
Mas como se percebe que se está a ter um enfarte agudo do miocárdio?
O sintoma mais relevante é uma dor, pressão ou a sensação de esmagamento torácico, geralmente atrás do esterno ou desviado para o lado esquerdo, que pode irradiar para os membros superiores ou para o pescoço e maxilar inferior. “É uma dor mais abrangente e não uma “pontada” ou “picada””, diz Duarte Cacela, que refere ainda que esta dor surge mais frequentemente após um esforço, uma refeição mais abundante ou depois do contato direto com o frio.
Contudo, também pode ser mais atípica e localizar-se perto do estômago, o que pode levar a um diagnóstico errado de indigestão. “Muitas vezes, é acompanhada por suores, náuseas e vómitos”, esclarece.
O dano mais frequente associado a uma enfarte agudo é a perda da capacidade contráctil do coração, que se traduz por cansaço e falta de ar em pequenos esforços e inchaço dos membros inferiores, abdominal e pulmonar. “São também muito relevantes as arritmias a que os pacientes com maior dano ficam vulneráveis, o que obriga, por vezes, à colocação de um desfibrilhador implantável para prevenir a morte arrítmica”, explica Duarte Cacela.
Por isso é que o tempo é importante na minimização das sequelas já que, se a intervenção for muito rápida, é frequente não haver qualquer dano, com uma capacidade contráctil cardíaca inalterada. “Daí a célebre frase que se diz em cardiologia: “Time is muscle!”, refere.
Depois da realização da intervenção, os cuidados a ter não têm tanto a ver com a angioplastia primária (já que é um método muito simples), mas sim com o próprio enfarte. Assim, os procedimentos que devem ser seguidos funcionam como forma de prevenir um segundo enfarte, como controlar os fatores de risco cardiovascular, que incluem o tabagismo, a diabetes, a hipertensão arterial, o sedentarismo e a obesidade, por exemplo, e tomar a medicação prescrita, “um antiagregante plaquetário e um fármaco para baixar o colesterol”, diz o médico.
Por outro lado, quando se realiza uma angioplastia que não é decorrente de um caso agudo, os cuidados a ter depois da intervenção são simples, explica Duarte Cacela. “São necessárias apenas algumas horas de repouso, com alta no dia seguinte. Mas existem já instituições na Europa que começam a dar alta no mesmo dia”, clarifica.
O que podia correr melhor
A Via Verde Coronária do SNS, uma forma de organizar os serviços para permitir a melhoria da acessibilidade dos doentes numa situação aguda aos cuidados médicos mais adequados é, segundo Duarte Cacela, ” um caso de sucesso em Portugal”, mas que pode ser ainda mais eficaz se alguns aspetos forem melhorados. Um deles tem a ver com o facto de o INEM ter deixado de efetuar o transporte secundário – quando o paciente já recorreu a uma unidade de saúde que não tem laboratório de hemodinâmica para efetuar um cateterismo ou angioplastia emergente e é necessária a sua transferência urgente para um hospital que reúna essas condições – em 2014. Esta situação, diz, constitui um entrave no objetivo de minimizar o tempo entre o início dos sintomas e a desobstrução coronária, que é crucial.
Além disso, também existem problemas geográficos, afirma o médico. “A Beira Interior apresenta um handicap no acesso à angioplastia primária, já que os pacientes são transportados para Coimbra ou Viseu, por isso justifica-se mesmo a abertura de um laboratório de cardiologia de intervenção na Covilhã”, explica.