Não foi difícil marcar a entrevista. Apesar de a repórter Beatriz Veiga, 9 anos, e de o escritor Mia Couto estarem a 8410 km da redação da VISÃO Júnior, vivem perto um do outro, na capital de Moçambique, Maputo.
Ambos têm ligações a Portugal, mas Beatriz nasceu na África do Sul e sempre viveu em Moçambique, enquanto Mia é moçambicano de gema.
A repórter tinha muitas perguntas para fazer e não deixou que os nervos a atrapalhassem. Até o entrevistado ficou impressionado com a sua descontração.
Mia Couto, 55 anos, tem livros publicados em mais de 20 países. Escreve poesia, prosa, e edita livros para todas as idades. É o autor moçambicano mais traduzido no mundo e já ganhou vários prémios literários.
Além de ser escritor, Mia formou-se em biologia e fundou uma empresa que faz estudos de impacto ambiental (avalia se um projeto prejudica o ambiente).
A entrevista transformou-se facilmente numa conversa entre amigos, e Beatriz até descobriu o prato preferido do escritor: caril de camarão.
Na hora da despedida, ficou no ar a possibilidade de se voltarem a ver. Afinal, o escritor é vizinho da avó materna de Beatriz.
Lê a entrevista completa e descobre como foi possível fazer um Repórter Júnior em Moçambique na edição de setembro da VISÃO Júnior!
Quando era criança já gostava de escrever?
Sim, mas ainda sou criança. [risos] Que me lembre, acho que comecei a escrever aos 14 anos.
Foi mesmo o primeiro, O Gato e o Escuro [2001], por o ter escrito quase sem querer. Não fazia ideia que esse livro ia ser publicado. Pediram-me uma história para uma revista, e eu escrevi , mas depois esqueci-me dela. Um dia, a minha editora mostrou-me umas ilustrações e perguntou-me se eu gostava delas, eu disse que sim. Então, mostraram-me as imagens com o texto e eu reconheci que era uma coisa minha. Fiquei um pouco assustado porque não tinha pensado em publicar aquela história.
O que o inspirou para escrever o livro Pátio das Sombras [2010]?
Essa obra foi encomendada. Pediram-me para escrever uma história a partir de um conto tradicional. Eu tinha escutado essa história em Cabo Delgado, Cabo Verde, e impressionou-me muito. Foi-me contada por gente muito velha, porque foi passando de geração em geração. O livro conta a história tal e qual como eu a ouvi, depois tem a versão que eu transformei com a minha imaginação, e no fim uma pequena explicação sobre as diferenças entre ambas.
É fã das redes sociais?
Não, nunca ganhei gosto por essas coisas. Acho que são o sinal de uma certa solidão. É como se as pessoas deixassem de ter amigos reais, que se podem tocar. Substituir o espaço físico onde podemos estar com os outros não é uma coisa que me agrade muito.
Se pudesse melhorar uma coisa na cidade de Maputo, qual seria?
Era preciso que Maputo fosse mais rica para ser capaz de tratar de si própria. Maputo é uma cidade pobre. É muito bonita, mas não tem capacidade para cuidar de si própria. O que eu gostaria é que houvesse mais cuidado com a nossa cidade e um espírito urbano – que as pessoas soubessem viver na cidade. Muita gente vem do campo, é rural, e não sabe viver numa cidade. É preciso tempo para as pessoas aprenderem.
Moçambique
A herança da língua
Os portugueses visitaram pela primeira vez o território moçambicano, em África, no início do séc. XVI. Uma das marcas que perdura até hoje é a língua portuguesa, falada por 9 por cento da população.
Moçambique é nove vezes maior do que Portugal e tem o dobro dos habitantes: 20 milhões. O país tornou-se independente de Portugal em 1975, mas esteve mergulhado numa guerra civil (quando as pessoas do mesmo país lutam umas contra as outras) até 1992.
Actualmente, Moçambique está em paz e a população passou a viver melhor.