Nenhum outro lugar do planeta tem um clima tão duro como o continente do pólo sul. A temperatura desce aos 40 graus negativos e os ventos sopram com a fúria de ciclones. Bem-vindos aos mantos de gelo da Antárctida, terra onde quase todos os seres vivos morreriam de fome e de frio, mas onde uma espécie resiste há milhares de anos, repetindo todos os invernos o milagre da vida. Têm asas mas não voam, são aves mas preferem mergulhar nas águas glaciares a desa.ar as alturas. Vamos fazer uma das viagens mais espectaculares da Natureza com os pinguins imperadores, tema do .lme A Marcha dos Pinguins. O biólogo e cineasta francês Luc Jacquet passou 14 meses a colher imagens raras destes animais extraordinários, no seu habitat de deserto branco. Estreia dia 3 de Novembro, num cinema perto de ti. A não perder.
O Verão, em Março
É altura de os pinguins imperadores saírem do oceano como torpedores e agruparem-se sobre o gelo. O Inverno dura nove meses. E é neste período que têm de se reproduzir. Não num lugar qualquer, mas bem longe, caminhando, desengonçados, uns atrás dos outros, 20 dias e 20 noites. Mesmo com a capacidade de regular a temperatura do seu corpo, alguns morrem de frio. Mas a marcha não pode parar. Em busca de um lugar sagrado. É lá que vão garantir a sua sobrevivência como espécie.
A procissão acabou. O frio, o vento e o nevoeiro não. É debaixo destas condições extremas que iniciam os rituais de acasalamento.
Os pinguins machos dançam e trocam beijos e gestos carinhosos com as fémeas. Os pares estão escolhidos e são .-éis durante a procriação. E até no meio do gelo o amor triunfa. Passam-se os dias, sempre terríveis, à espera do tesouro mais valioso: o ovo. Uma festa que pode ser também um drama. As mães têm de fazer 200 quilómetros de regresso à procura de comida, os pais .cam. Se a passagem do ovo para os machos corre mal, este congela, racha ou parte-se um ano perdido.
Os pais chocam, desajeitados, mas com muito afecto, os ovos entre as suas patas e o corpo quente. As mães já chegaram ao mar, à procura de pequenos camarões e peixe. Mas também elas podem ser comidas pelos maus desta história: os leões-marinhos. Elas terão de voltar depressa para junto dos machos, que chegam a .car dois meses sem comer nada, graças a reservas que foram acumulando durante o Verão.
E quando as crias saem da casca, .cam logo a saber que nasceram num mundo branco, gelado e cruel. E, em breve, terão fome. Mas o milagre aconteceu. As mães voltaram. As famílias estão juntas de novo. Só que os machos não podem .car muito mais tempo. Exaustos e esfomeados têm, também eles, de fazer 200 quilómetros até ao oceano para comer. E os pequenos pinguins vão crescendo e tornando-se cada vez mais fortes. São alimentados pelos pais, que continuam a marchar as vezes que foram precisas para que nada lhes falte. Só não as podem proteger dos ataques das temíveis pardelas gigantes, grandes aves-marinhas que são as outras más desta história. Mais dia menos dia, as crias estarão em condições de partir. Vão passar quatro anos no mar. Para onde vão, é ainda um mistério. À espera de um novo .lme. Quando voltarem, já adultos, à Antárctida, será a sua vez de fazer a maravilhosa marcha dos pinguins.
Texto: Henrique Botequilha