Ao fim de dois dias, já saíram algumas surpresas da cimeira do clima. Uma foi o anúncio da Índia de se tornar neutra em carbono até 2070 (20 anos depois da UE e dos EUA, e 10 anos depois da China), o que, apesar de tudo, é significativo, para um país em desenvolvimento que conta com o carvão para produzir mais de metade da sua eletricidade. Outra foi o acordo entre mais de 100 países para reverter a desflorestação, de forma a garantir que, em 2030, se planta mais floresta do que aquela que se abate.
Mas a maior conquista até agora foi a aliança de quase 90 países (que inclui o bloco da UE, os EUA e, surpreendententemente, o Brasil) assinou, na terça-feira, 2, um compromisso de reduzir em 30% as emissões de metano até ao fim da década. O metano é um gás com um potencial de aquecimento 25 vezes superior ao dióxido de carbono, apesar de ter um tempo de vida na atmosfera relativamente curto (12 anos, contra centenas de anos do CO2). Segundo o IPCC, é responsável por cerca de um quarto da subida de temperatura média global.
“Fácil de fazer”
Vários cientistas e organizações têm apelado, sobretudo nos últimos dias, à redução das emissões do metano, considerando-a uma autoestrada para manter viva a meta de 1,5 ºC de aumento máximo de temperatura, definida pelo Acordo de Paris. Se a promessa for cumprida, será possível cortar 0,2 ºC desse aumento até 2050.
Para Pedro Nunes, do grupo de alterações climáticas, energia e mobilidade da ZERO, “o metano é a peça chave para reduzir as emissões até 2030”. “Só cortando nas emissões de metano se consegue reduzir o efeito de estufa rapidamente. Além disso, o metano é um gás natural, que tem um valor económico, pelo que reduzir as suas emissões, por exemplo evitando as sua fuga na produção, transporte e distribuição de gás natural, é fácil de fazer e custo-eficaz.”
Francisco Ferreira, presidente da associação ambientalista, acrescenta que é importante que esta meta se traduza numa redução do uso do gás natural, e que isso só é válido com uma maior aposta em renováveis. “Daí um ligeiro ceticismo, porque muitos países encaram o gás natural como o vértice principal da transição energética.”
Há mais razões para ceticismos: a aliança antimetano não foi assinada por alguns dos maiores emissores. A China, a Índia e a Rússia estão, pelo menos por agora, de fora do pacto. Mas a inclusão do Brasil é importante, sendo país um dos maiores produtores mundiais de carne bovina. O acordo, anunciado hoje, terça-feira, 2, por Joe Biden e que começou a ser desenhado em setembro, abrange um conjunto de países que detém dois terços da economia mundial.
Apesar de o metano ser o principal gás com efeito de estufa decorrente da produção de carne, grande parte da redução deverá ser conseguida através de reparações em gasodutos e oleodutos com fugas.