2022 aproxima-se envolto em nevoeiro. Adensam-se ameaças económicas, entre as quais o regresso da inflação – não por via da política monetária, mas do aumento continuado do preço das matérias-primas, dos transportes e da energia –, intensificam-se algumas ameaças geopolíticas – do leste europeu, ao mar da China –, as democracias liberais agonizam, e resta-nos cada vez menos tempo para fazer face às urgências sociais e ecológicas que constituem a ambição para a década 2020-2030 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, do Acordo de Paris sobre o clima e do Pacto Ecológico Europeu.
Relativamente a Portugal, além destes desafios globais, acresce o da eleição de um novo Governo, numa altura em que o partido dominante – o Partido Socialista – dá sinais de uma crescente falta de vitalidade. O António Costa criativo e reformista dos tempos da Câmara Municipal de Lisboa e dos primeiros anos de geringonça perdeu-se – no nevoeiro e no aparelho.
Para lá da questão da pandemia, para que 2022 seja melhor do que 2021, é fundamental que surjam ideias mobilizadoras de futuro, bem como termos um foco maior na ação, sempre em diálogo e cooperação. Os ambiciosos objetivos delineados para a década, dos quais depende a transição para um mundo justo e sustentável, apelam a lideranças sábias, corajosas e mobilizadoras, capazes de conciliar radicalidade e moderação.
Segundo as Nações Unidas, todas as semanas a população mundial aumenta 1,5 milhões de pessoas e 3 milhões de pessoas entram na classe média, o que representa uma pressão brutal e crescente sobre os recursos naturais e os equilíbrios biofísicos do planeta, críticos para a vida na Terra. Acresce que o PIB per capita, sendo hoje 14 vezes superior face há 200 anos, continua a esconder inúmeros fenómenos de desigualdades e exclusão, além de que continua a ser uma medida pobre para avaliar bem-estar.
Por um lado, 2022 começa com uma Comissão Europeia fortemente comprometida com a transição para um modelo de desenvolvimento sustentável, um secretário-geral das Nações Unidas mobilizador e um Papa raro no Vaticano. Por outro, parece haver muito poucas segundas linhas políticas, nomeadamente, ao nível do G20 – e as que há parecem manietadas. Mais inquietante ainda, depois de dois anos de pandemia, os níveis de esperança e desejo de algo mais – de algo que vá para além da loucura da normalidade – parecem estar a bater no fundo. Na Europa, vai sentir-se a falta de Angela Merkel, que se despediu voluntariamente de dezasseis anos de poder, sem um beliscão e ao som de uma canção punk.
Para correr bem, 2022 apela a que cada um procure uma maior conexão interior, sem o que é difícil termos uma relação justa com os outros e com o planeta. Mas 2022 apela, também, a um maior papel da ciência e da razão no desenho da ação, a diálogo e moderação como método, a criatividade e persistência na demanda do que é justo, a maior gratidão pela vida e a um maior entusiasmo em celebrá-la sempre – we want bread but roses too, como dizia Helen Todd.
Bom ano.