O que faz uma lisboeta, que sempre viveu na cidade e nunca teve qualquer ligação ao campo, desejar ter uma horta? Ora aí está: para dar cabo da minha ignorância agrícola. Mas esta coisa estranha não nasceu de um dia para o outro. É fruto de um longo processo que hoje consigo ligar aos tempos de escola. Quando ouvia os meus colegas dizerem que iam à “terra” passar as férias do Natal, aquilo intrigava-me. Eu também ia à “terra” dos meus pais, mas lá em casa não lhe chamávamos assim. Talvez por ser o Porto, a segunda maior cidade de Portugal – nada rural, 100% urbana. Senti-me, por longos anos, uma “sem-terra”.
Mas vivia muito bem assim.
Até ser mãe. E começar a questionar-me acerca da qualidade dos alimentos que comprava, num qualquer supermercado, para dar aos meus filhos. Quando nasceu o segundo, passei-me para os biológicos e comecei a receber cabazes de legumes e frutas em casa, apenas com produtos da estação. E, coincidência ou não, passei a dedicar-me, na revista, a estes assuntos da comida e arredores. Naturalmente, aproximei-me de produtores, de novos rurais, de nutricionistas…
Aos poucos, lá em casa, começámos a cultivar umas coisinhas na varanda, a experimentar plantar para comer. Mas nunca houve mais do que meia dúzia de tomates, outros tantos morangos, rúcula e algumas ervas aromáticas – que sempre consumimos com toda a propriedade.
Desde que soube que a Câmara de Lisboa disponibiliza pedaços de terra a hortelões urbanos nunca mais perdi de vista os concursos. Só desmoralizei um pouco, ao aperceber-me da trabalheira que dava manter uma horta, culpa do exemplo de uns primos que há um ano ganharam um terreno em Telheiras.