Viagens longas e grandes expectativas andam de mãos dadas. Das segundas podemos afirmar: muitas são superadas, poucas saem goradas. Outras viagens no-lo haviam ensinado inequivocamente. Pela frente tínhamos quase 4 meses de nova instrução.
Entrámos na China através de Pequim. Começamos pela metrópole que dizem poluída, sobrepovoada e enorme. Em finais de Agosto, o sol brilhava no céu, os Pequineses estavam de férias e a cidade é, na verdade, gigantesca.
Depois de cerca de 13 horas de voo, e todas as outras a que as andanças aeroportuárias obrigam, pisamos pela primeira vez o ponto mais oriental das nossas vidas. Desembarcamos numa realidade nova, distinta, incógnita.
Para aqueles que vão à procura das rasteiras e típicas casinhas chinesas, Pequim vai desapontar. A cidade está em permanente (re)construção. Cresce na vertical. As diferenças entre a capital chinesa e qualquer metrópole ocidental são muito ténues. As centenas de edifícios e arranha-céus modernos dominam a paisagem citadina. Pequim entra no séc. XXI a um ritmo acelerado.
Acertar o relógio biológico foi penoso. Cumprimos o que os “manuais” ditam ser eficaz para combater o jet-lag, mesmo assim, às 4:30 da manhã tudo dormia… menos nós.
A língua e a comida viriam a revelar-se dois casos bicudos. Já o sabíamos. Falantes de Inglês são ainda uma raridade numa cidade com mais de 20 milhões de habitantes. Mas vão surgindo, aos poucos. Há que entender que é no turismo interno que está a grande fatia das receitas. Logo, é na capital que há também um esforço por reunir a riqueza e diversidade gastronómicas de mais de uma vintena de províncias. Foi o que descobrimos no Wángf?j?ng Snack Street e no Donghuamen Night Market, dois locais no centro da capital repletos de restaurantes e bancas de comida com uma multiplicidade de oferta avassaladora e inacreditável. A novidade dos cheiros intensos e inomináveis, das sonoridades gritantes, dos alimentos inconcebíveis agarra-nos com veemência. É deste exotismo que vínhamos à procura. Mesmo pressentido que é um pouco fabricado, não nos importamos. Afinal, não vimos disto em mais lugar nenhum do mundo.
Pequim é imensa em muitos aspetos. A capital imperial transpira grandeza épica nos seus elaborados monumentos envolvidos por cuidados e fluidos jardins. Há uma execução metódica, com invocação às superstições e crenças duma civilização organizada milenar. As cores vibrantes, os números auspiciosos, os espaços amplos e a simetria são traços importantes na arquitetura palaciana. Simetria essa que se espelha na perpendicularidade das principais avenidas em redor do ex-líbris, a Cidade Proibida. E que se dissipa no emaranhado labiríntico das ruelas dos poucos “hutongs” que sobreviveram à voraz modernização.
É imensa também nos milhões de rostos que percorrem as suas artérias de caos organizado. A manhã começa com o imprescindível tai-chi, uma pausa no trabalho reúne homens em mangas de camisa à volta dum tabuleiro de xadrez chinês, ao almoço pequenos restaurantes e bancas de rua servem os clientes a um ritmo desenfreado, os que têm tempo livre usufruem dos amplos espaços ajardinados, findo o dia de trabalho a invasão das lojas é uma constante. A capital está em constante movimento.
Os ocidentais são coisa rara. E como raros que são, são também exóticos.
Logo na praça Tiananmen somos descaradamente abordados por um casal que talvez pise pela primeira vez a sua capital. Vieram provavelmente duma província distante. Entre gestos ainda ininteligíveis para nós lá percebemos que querem uma fotografia… Connosco! Nos seus rostos líamos alegria esfuziante, nos nossos, espanto. Era apenas o primeiro de muitos episódios decalcados a papel químico. Na Cidade Proibida, no Palácio de Verão, nos jardins do Templo do Céu, nos lagos de Beihai e Qianhai tudo se repetiria. Na terra do Sol Nascente, as gentes fazem os ocidentais sentirem-se como vedetas.
No dia que nos despedimos de Pequim, o sol já mal rompia o smog, os Pequineses regressaram à labuta, e Pequim continuava gigantesca. Aprendemos em Pequim que entre o histórico e o moderno, o equilíbrio é muito ténue. Isso é patente na obra e no espírito humanos. Pressentimos uma espécie de saudosismo da glória imperial de tempos idos, mas também a vontade de conquista dum lugar de pódio nestes tempos de modernidade.
Alexandre e Anabela (VagaMundos)
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